UMA RUA PARA CHAMAR DE MINHA
Ela começa em frente ao poço artesiano, que nos fornecia água, ao lado da Igreja Matriz de Curitibanos. Nas duas primeiras quadras mostra um pequeno declive, porém a partir da terceira vai se tornando uma acentuada ladeira. É longa e termina no Bairro do Capão. Morávamos na segunda quadra, na casa assobradada de número 60, que foi projetada por meu tio Nelson, irmão de mamãe, arquiteto formado pela UFRGS, em Porto Alegre. Fico surpresa quando visito minha cidade, por ver que a casa resiste, incólume, quase com a mesma aparência de quando a deixamos em 1970, ao mudarmos para Curitiba. A cor das paredes, entretanto, hoje é bege, em vez do verde de antigamente.
Papai e mamãe não quiseram vendê-la. Alugaram-na para que o valor do aluguel ajudasse a nos mantermos nos primeiros tempos na capital do Paraná. A rua está intacta, calçada com paralelepípedos. As casas vizinhas, em sua maioria, preservadas, somente seus moradores mais antigos já se foram. Após mais de cinquenta anos, o jardim com os Butieiros, o pé de Magnólia e os Cedros permanece. Estes, crescidos e envelhecidos, é verdade, mas para minha surpresa e alegria, resistiram a todas as intempéries e continuam lá. E o que havia de mais bonito na propriedade, o quintal enorme, com araucárias e árvores frutíferas hoje é bem cuidado pelo mano Beto.
Depois que papai e mamãe faleceram, a casa ficou para este meu irmão, que também não quis vendê-la. Papai dizia que imóvel não se vende, compra-se.
Na calçada da Rua Conselheiro Mafra, quebrávamos coquinhos de Butieiro, pulávamos corda, jogávamos bola e os meninos desciam em seus carrinhos de rolimã, aproveitando o bom declive. Todo mundo se conhecia e podíamos folgar ali, sem medo. Carros? Vez ou outra passava algum. Carroças, eram muito comuns. Hoje, naturalmente, há mais tráfego, porém a rua conserva seu peculiar aspecto. Como é bom constatar que com o tempo a cidade cresceu mas a vida da população não mudou muito.
Guardo de lá minhas melhores lembranças de infância e juventude. A casa e o terreno, ainda hoje, me dão aquela sensação gostosa de pertencimento.