O dia sem crianças

 

          1. Já não tenho meus filhos morando comigo. Cresceram e bateram asas. Estão longe! Casaram e me deram cinco netos. Por isso, no Dia das Crianças, em minha casa, não se ouviu um piu. Silêncio total. Faltou aquela algazarra infantil, que às vezes chateia, mas é sempre muito boa. Saudades... Saudades...

          2. Nesse silêncio monacal, ficamos, Ivone e eu, evocando o tempo dos filhos pequenos recebendo seus presentinhos no Dia das crianças. Eles sorriam e nós também. Eu vibrava com a alegria dos dois pimpolhos, descobrindo nos seus olhos a ternura do agradecimento filial. Tempos que não voltam.  Ficaram, sim, na memória e no coração. 

          3. O Presidente Artur Bernardes, pelo Decreto 4.867, de 5 de novembro de 1924, oficializou o dia 12 de outubro como o Dia das crianças. Essa data, porém, só se consolidou com a ajuda da empresa de brinquedos Estrela, em 1955. O Dia das crianças - feliz coincidência -, é comemorado na mesma data em que o Brasil festeja sua padroeira, Nossa Senhora da Conceição Aparecida. Muito bem !

          4. Passei pelas esquinas de Salvador e vi, constrangido, criancinhas paupérrimas, no seu dia, pedindo, pelo amor de Deus, um presentinho. Aquela teve a felicidade de receber uma bonequinha de pano; aquele, um carrinho ou uma bola, de mãos caridosas de passantes apiedados. Vi e rezei.

          5. Faço, agora, um apelo à Mãe do Menino de Belém: não deixe  as crianças pobres das esquinas de Salvador permanecerem ao abandono, ao deus-dará. Peço que lhes dê casa, livros, comida; e, acima de tudo, a certeza de que terão dias melhores. Que tudo vai passar.

          6. Lembrei-me, que, no meu tempo de menino, nem sempre, no Dia das crianças, eu recebia presentes. Faltava grana. Éramos oito. Como comprar um regalo para cada um? Não raras vezes, meu presente era o beijo doce de minha mãe e o abraço carinhoso do meu pai. Era o bastante para ter o melhor e mais feliz dia de minha vida.

          7. Neste último Dia das crianças, 12 de outubro de 2022, quebrei o silêncio de minha casa recitando "Meus oito anos", de Casimiro de Abreu (1839-1860) - " Oh! que saudades que tenho/ Da aurora da minha vida, /Da minha infância querida/ Que os anos não trazem mais! / Que amor, que sonhos, que flores,/ Naquelas tardes fagueiras/ À sombra das bananeiras,/ Debaixo dos laranjais" etc., etc., et cetera.

          8. "Meus oito anos" é um dos poemas que a gente nunca esquece. É um poema que os anos passam, passam, passam, nosso cabelo prateia e ele continua na nossa memória. Morremos, com ele no coração.  Acho que Casimiro de Abreu jamais imaginou que esses seus versos, cheios de doçura, chegariam à eternidade...    

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 14/10/2022
Reeditado em 14/10/2022
Código do texto: T7627270
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