QUANDO O AMOR VIRA NADA

Todo amor, por mais amor que seja, tem seus reveses com dias nublados

Fica ranzinza, rosna, despenteia seus poros, só entristece

Aquele amor, outrora viril, dono do chão, rei das marés, frangalha, capenga

Seus donos então se estranham, se trombam, ecoam em margens opostas

Esquecem do quanto cerziram e arremataram juntos, que nada

Esquecem do tanto que trocaram suores, que nada

Esquecem de tudo que não era pra esquecer

Então o desamor se espalha feito praga letal

Então as criaturas jogam longe cada cheiro do seu coração

Ficam trastes fétidos, esquisitos e tristes, tão tristes, só tristes

Mas mesmo embebidos nas garras do desacordo, algo perdura

Um fiapo do lindo de outrora resiste num canto qualquer

Fica escondido, calado, com medo de respirar

Pois dentro de si guarda a essência que virou pó, virou lixo

Aquela poção mágica traria de novo a luz, de novo o sabor

Traria de novo o que foi tão bom e gostoso certa vez, lembra?

Mas o tempo, cruel, malvado, traiçoeiro, não descansa até esmagar de vez

Fará o diabo pra descobrir o paradeiro daquela sobra de amor

Pra levar aos estilhaços cada parte da sua pele, do seu caminhar

De longe, Deus só observa, quieto como Deus só

Nada faz, pois os homens que tratem de suas mazelas, dos seus desafinos

Assim fica, tempos a fio, numa quietude sem par

Sem saudade daquele amor que já não ecoa mais

Daquele amor lépido, de passos altivos, de face rosada

Que agora é só deserto, só ferrugem, só nada

 

 

Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 14/10/2022
Reeditado em 14/10/2022
Código do texto: T7627058
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