O TIRA MANCHAS
O TIRA MANCHAS
28set22
Estava eu saboreando um Merlot Francês que me foi presenteado, quando uma gota se recusa a ser degustada e resolve deixar sua marca na camisa de um suave amarelo que "inaugurava". Vinho de suave sabor de frutas vermelhas que trazia ao fundo um toque marcante de café. Fim de noite dedicada a Baco que se encerra e nos deixa prontos para o sono e felizes pela noite e pelo novo dia que em breve nascerá.
Sol tímido, que se diz presente por trás das nuvens carrancudas. O relógio biológico com seu silencioso som agudo me alcança e me faz levantar. Roupas espalhadas sobre a cadeira de apoio me fazem lembrar da gota na camisa amarelada, que ao verificar lá estava como se fosse um asterisco um tanto ovalado.
Preparo meu café da manhã, feito com um pó de qualidade na prensa francesa e servido sem açúcar acompanhado de três ovos batidos com requeijão.
Devidamente desperto, pego o carro e vou ao supermercado, procuro um tira manchas capaz de devolver o estado anterior à gota na camisa. Leio alguns rótulos e fico com aquele que claramente promete a limpeza da mancha de vinho.
Sigo as instruções da embalagem, passando o produto sobre a mancha e deixando de molho por 20 minutos e enquanto espero, passo as minhas obrigações computacionais. Findo o tempo do molho da camisa, com um excesso de 2 minutos, retiro da bacia e ao verificar vejo que a mancha havia desaparecido, mas junto com ela o tecido que a continha. Procuro o telefone do SAC do fabricante do tira manchas e sou atendido por uma voz sonolenta e distante que não permitia saber se masculina ou feminina. Narrei o ocorrido. A voz do outro lado me pergunta o que pretendo, respondo eu que desejo o ressarcimento do prejuízo que tive, e quem me atende diz não ser possível, pois em casos semelhantes e formalizados judicialmente a empresa reverteu a solicitação em falsa denúncia e declarando pedido de prisão por calunia e difamação, e ato contínuo interrompeu a ligação.
Revoltado, passo a pensar na ousadia do que me fora respondido. Será que era por uma noite mal dormida, ou um total desprezo e ousadia daquele empregado por seu emprego. Resolvo que daria queixa no órgão de proteção ao consumidor. Lá chegando fui cordialmente atendido e ao relatar que fui vítima por crer que dentro da caixa do tira manchas estaria contido o que se lia em sua parte externa, a atendente me diz cobrindo a boca com a mão: meu Sr. não faça tal denúncia, essa indústria tem parte com a alta justiça e em outras reclamações os reclamantes foram presos. Ao meu dizer que isto era um absurdo a atendente me diz que entendia e que eu estava coberto de razões, mas estávamos vivendo em um período de exceções judiciárias e a lei escrita já não tinha tanto peso.
Me acalmo e penso que atualmente não podemos mais confiar de que nos interiores das caixas estão confirmados aquilo que vemos do lado de fora.
Precisamos agir estrategicamente, pois nossos direitos custam bem mais que o preço daquela camisa.
Geraldo Cerqueira