A nuvem de poeira nos engoliu

Muitos de vocês já devem ter ouvido falar dos buracos negros, um fenômeno astronômico que assusta os viventes deste nosso planetinha. Assusta principalmente devido aos modestos conhecimentos que temos sobre o Universo. Na minha ignorância, entendo tratar-se de um campo gravitacional — não me peçam mais detalhes — tão intenso que “engole” corpos, partículas e até mesmo a radiação eletromagnética, como a luz. Não é espantoso? Assim me parece.

Enquanto não somos “engolidos”, se é que isso vai acontecer algum dia, outros fenômenos, mais terrenos, preocupam. Outro dia, estava eu na estrada e olhei para trás. Fiquei preocupado. Não era um buraco negro, talvez um “buraco cinza”, avermelhado, imenso, ameaçador. Resolvi acelerar, mas percebi que não conseguiria escapar. Uma gigantesca nuvem de poeira avançava em minha direção. Na medida em que se aproximava, ficava mais escura e mais alta. A terrível nuvem rapidamente se aproximava, a impressão era a de que ia engolir tudo a qualquer momento.

Pelo retrovisor, eu vislumbrava um vendaval gigante, um pandemônio de partículas, de solo moído, de árvores em polvorosa, passarinhos e ninhos arrastados, folhas, galhos e, principalmente, poeira. Muita poeira. A qualquer momento, iríamos desaparecer. Sufocaríamos? Seríamos triturados na algazarra de pó, ciscos e terra solta? Inútil parar, nem para tomar um cafezinho e tentar extrair lições do acontecimento. A força dos elementos é insensível aos nossos apelos.

Se o que sabemos sobre os buracos negros ainda é elementar, a origem das nuvens de fumaça e poeira já foi desvendada. Para tentar entender o funcionamento do Universo e seus segredos, as organizações de pesquisa enviam os melhores satélites, tiram fotografias de lugares longínquos, promovem colóquios, seminários, publicam artigos e defendem a pesquisa científica. E sobre as mudanças climáticas e os fenômenos associados a ela, o que sabemos? O conhecimento acumulado ao longo dos anos nos ajudará a controlá-los e evitá-los? Ou seremos engolidos?

Nuvens de poeira e fumaça estão interligadas, de modo geral, a fenômenos atmosféricos e socioambientais. Sua ocorrência e intensidade cada vez mais assustadoras revelam a maneira displicente e imprópria com que alguns setores tratam o solo, a produção agrícola, os ecossistemas, a cobertura vegetal. Há quem defenda que o solo é um mero suporte para o desenvolvimento das plantas. Muitos, entretanto, entendem que há vida no solo e que imaginá-lo como reles sustentáculo o deixará desprotegido, comprometendo suas características imprescindíveis à saúde do planeta e de seus habitantes.

Meu avô, certamente, nunca deve ter ouvido falar desse fenômeno que intriga os astrônomos na atualidade. Mas ele já se preocupava com a força dos ventos que antecediam as chuvas da primavera. Uma de suas atitudes era o plantio de árvores. Quando a nuvem passou por mim, percebi o triste espetáculo de lixo espalhado, de fumaça de queimadas, de folhas e frutas caídas, de galhos quebrados. Lembrei-me das preocupações do meu avô.