O QUE É SER NORMAL?

JOEL MARINHO

Preso na grande gaiola da normalidade eu não posso fugir, não posso voar, não posso ser feliz ou infeliz, não posso ser, a não ser que seja igual ao outro, aos outros, aos milhares, aos milhões, aos bilhões de pessoas existentes no planeta.

Enfim, eu tenho que ser normal, senão...

Se eu não me encaixar na normalidade fujo aos padrões preestabelecidos pela minha comunidade, pelo meu país, pelo planeta.

Como é difícil ser diferente!

E na chatice da normatividade eu tento voar, amanheço o dia cantando e alguém no meu prédio grita: “cala a boca, maluco!”

Ah, eu não posso ser feliz, a não ser dentro das regras.

A chuva cai e meu instinto infantil aflora, lá vou eu correr e brincar na chuva com as crianças, porém meus fios de cabelos brancos me denunciam e alguém me discrimina: “um velho querendo ser menino.”

Não posso vestir uma roupa mais descolada, pois corro o risco de está me apropriando da identidade de alguma “tribo” juvenil.

É, eu não posso ser nada além daquilo que definiram a mim. Logo preciso tomar uns remedinhos para me acomodar no rol de minha velhice a qual a sociedade determinou. Lá vou eu dormir oito horas por dia como mandam os mestres da normatização.

Amanheceu o dia e uma criança qualquer de apenas cinco anos resolveu ser feliz, pulou e gritou a sua felicidade de maneira eufórica, quebrou um prato da mãe, riscou o carro do pai para demonstrar o amor que tem pelo mesmo com um rabisco da imagem da família.

Pronto, já foi diagnosticado, tem TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade), logo precisa de um remedinho para ficar calmo enquanto o pai reclama o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Maldito ECA, em “meu tempo” tu já tinhas levado um corretivo daqueles para aprender não fazer mais “arte”.

Diante a impossibilidade de “sanar” aquela alegria toda com uma surra caprichada procura-se tratamento, então mete uma Ritalina na criança, afinal, felicidade demais causa “problemas e prejuízos”, fugiu à regra da normalidade.

- Mas quem diabos inventou essa regra maldita!

- Cala a boca, quer tomar um remedinho também?

- Acabou de falar anteriormente que gosta de cantar, banhar na chuva, usar roupas descoladas e quem sabe até falar sozinho com as coisas ou plantas em casa. Mais uma ocorrência dessa e serás levado em uma camisa de força para o primeiro hospital psiquiátrico, está fora da normalidade.

Diante disso já calei, quero ser normal, quero ser normal, mesmo que não entenda o que é ser normal e quais foram os critérios adotados para isso.

Posso ser feliz, mas nem tanto, posso ser triste, mas nem tanto, posso ser doente, mas nem tanto, posso ter saúde, mas nem tanto, posso ser magro, mas nem tanto, posso ser gordo, mas nem tanto, posso ser preto, mas nem tanto, posso ser albino, mas nem tanto.

E como eu vou viver sem cantar fora do tom e com as letras trocadas tomando banho pela manhã em meu minúsculo banheiro sem ninguém me chamar de louco?

Por favor, tragam-me um advogado, não aguento mais essa prisão da normatividade, deixem-me na minha “loucura”, respeitem a minha liberdade ou me tragam uma dose de cicuta! Ser normal é muito chato!