Toda vez que me sento no trono - a rainha também merece um minuto de estrelismo- retiro a coroa e aciono o modo "off-line". Abro a caixa da memória e, do seu interior, retiro minha história, em flashes imperceptíveis, no corre do dia.
Primeiro vem a imagem de meu avô paterno, que nunca vi, foi preciso retirá-lo do quadro da parede para fazer parte da árvore genealógica. Depois, minha avó com tranças enormes e terço na mão. Com ela aprendi que Deus não dorme e nem ela (nem eu). Meu pai aparece nas entrelinhas, trabalhava tanto que nunca o vi viver, só depois de aposentado. Somos tão inconsequentes com o tempo que só o valorizamos quando nos falta. Minha mãe, ao contrário, sempre em casa. Embora seus dias fossem uma eterna costura. Até hoje, debruçada sobre a máquina, faz do nosso mundo uma fantasia, de costas. Quem dera tivesse o dom de plastificar essa identidade que são retratos de uma vida inteira de renúncias e emoções. E quando enfim, a paz parece reinar no interior da mente, à porta bate:
- Vai demorar? Mãe quer cortar o cabelo!
E a rainha, agora destronada por um déspota esclarecido, junta suas lembranças. Coloca a coroa e vai dar conta da vida que a espera, porque só tem reminiscências, quem juntou os retratos da vida, sem contudo, se desfazer dos que não eram tão bonitos...