“Tá mais magra… fez uma tatuagem nas costas…Humm. Mas tá frio aqui. Ela não tá com frio?”. – Ele anda encarando o chão e as estantes mais baixas. Não quer que ela o veja. – “Conversar sobre o quê depois de tanto tempo?” (…) “Bah! Ficar fingindo apreço e ao mesmo tempo, indiferença? Eu fico exausto só pensar…”.

– EEEEEI!!! EIII!! E AÍÍ TUDO BOOM?? – (“Own, tarde demais…”) – Ela grita… olhares inevitavelmente se encontram. – Seus olhos são vivos. Acesos… revitalizados. Parece absurdamente feliz consigo mesma, mas não sorri. Ele se assusta, sua face esquenta… acaba exagerando, num aceno alto e abobalhado junto ao sorriso daquele jeito que a dentista pedia pra dar, quando era menino. Ele não obedecia e mesmo assim ganhava doces no final (ninguém no mundo inteiro o tratou assim outra vez). Abriu os braços num abraço que caberia o mundo inteiro… ou pelo menos: isolar um quarteirão. Ela trava em sua frente e lhe estende a mão num cumprimento formal entre dois conhecidos. NÃO amigos. Uma “conversa” se inicia, mas tudo é estranhamente parecido com entrevista de emprego. Tagarelam sobre conquistas… Novos empregos… salários… - Aquele ali estacionado, é meu! – Ah eu tô a pé… minha casa é aqui perto. Sim ainda moro com minha mãe. – Cursos que concluíram, coisas que conseguiram comprar… principalmente “AQUELAS” coisas que falavam tanto em comprar juntos e que agora ela tinha SÓ dela… só pra ela. (“Deve ter ido ao cartório, se casar com a máquina de café-expresso…”), ele pensou e quase uma gargalhada saiu. Ela ainda o conhecia suficientemente BEM para lembrar que prendia a risada imaginando coisas ridículas quando ficava desconfortável? Se sim…Estaria frito.

 

*******

 

Ela olha o relógio diversas vezes enquanto ele fala. O telefone… De novo e de novo… Ele continua contando “novidades incríveis” com uma voz nervosa, meio trêmula. Continua, e por dentro se sente perdido. Não completamente, mas… Ele sente que perdeu alguma coisa.

Provavelmente perdeu… Mas não é ela. E nem (não exatamente) sua recente “Grandessíssima oportunidade perdida de ficar em casa e deixar o salgadinho de queijo pra lá” que esse encontro causou. Muitas vezes o significado de “perder” está justamente no momento em que algo em você deixou de existir… e você nem sabe definir direito o que era…Pois já se foi.

– Então… Bom te ver… – Ele se entrega, ele desiste… ele chega ao fim. “Tá bom, você venceu, ‘Deusa da perfeição’, ‘Prefeita da Cidade da Formosura’”. – Ele sente como se tivesse alguma obrigação moral de se sentir humilhado… ainda um menino. E ao mesmo tempo sente alívio diante da não-obrigação de tê-la por perto; de qualquer forma… quis até que já houvesse um novo amor só pra existir durante aqueles minutos de conversa e em seguida desaparecer quando virasse a esquina.

Ela sai, dando um aceno enquanto fala ao celular. “Ela tá tão ocupada… da MAIOR importância” … “Tão séria, formal, formada, formosa, toda tatuada e ocupada…”, se afastam. Ela segura o telefone; Ele segura uma sacola com morango, guaraná e um Cheetos. Ela segura o telefone com força em sua orelha; Ele já não pode mais vê-la. Seus olhos então finalmente transbordam. Num mundo de lágrimas grossas e fortes de romper represas e inaugurar parques aquáticos. Ela entra no carro e se tranca… não pode demorar, têm que ter cuidado com assalto…! Olha o espelho do batom e depois do retrovisor… Tenta por todos os vidros do carro enxergá-lo ao longe, indo embora… ver um pouco mais de sua tristeza e miséria com queijo nacho. Mas ele se foi… muito rapidamente se foram: O Homem e o morango, o Menino e o Cheetos… Ela desaba. Vidros fumê, para motoristas medrosos e também mais chorosos. – “Alô… Sim. Sim… ENCONTROU? Como foi…? Como você se sente…?”…“Quer marcar consulta?” – Pergunta o analista…

 

 

Henrique Britto
Enviado por Henrique Britto em 11/09/2022
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