O CHARME DO DETETIVE
Meu irmão Décio era por assim dizer, o galã da família. Certa vez arrumou uma namorada do estado de São Paulo e a trouxe para conhecer a família. Era moça bonita, de fino trato e porte elegante. Veio com ela a irmã mais nova, mocinha de uns quinze ou dezesseis anos e de belos olhos. Quando vi a garota já fiquei entusiasmado. Achei que a gente combinava e tenhamos algo em comum: Era a irmã caçula da noiva e eu, o irmão caçula do noivo. A noite estava agradável e fomos todos a uma confeitaria, o point da cidade. Meu irmão convidou os seus amigos e estávamos em um grupo muito animado. Mas, decididamente aquele não foi um dia auspicioso para mim. Logo de cara ao abrir a garrafa de coca deu aquele “tchiiihhhhh” e vazou para todo lado. O mano já me deu uma encarada. Conversa vai conversa vem e eu ali perdido naqueles olhos. A mocinha era realmente muito linda, talvez um ano a menos que eu. Foi então que sugeriram aquela brincadeira de detetive. Distribuíram os papeizinhos com os nomes de DETETIVE, ASSASSINO e VÍTIMA. O assassino executava as vítimas com uma piscada e era dever do detetive prender o patife. Todos concentrados no jogo e eu encadeado pelo brilho daqueles olhos. A certa altura julguei que ela estivesse flertando comigo e sem pensar duas vezes fulminei-a com uma piscada cinematográfica. Junto com a piscada, uma porção generosa de charme. Fui preso no ato. E ela me deu voz de prisão com uma categoria que só vocês vendo: “Você está preso em nome da lei” Que voz! Que autoridade! Que graça! E eu já estava preso fazia era tempo. Mas aí deu confusão. Um rapaz protestou: “Mas o assassino sou eu!” e todos queriam ver o meu papel. O meu papel? Um papelão, na verdade. O mano olhava pra mim e resmungava algumas palavras em uma frequência de ventriloquista que ninguém poderia entender. As coisas não andavam muito bem para o meu lado e para fechar com chave de ouro eu ainda fiz o favor de entornar na garrafa de refrigerante. Lavei a mesa. E ainda por desaforo respingou na camisa branca do mano. Aquilo foi a gota d’água. Talvez que fosse o balde de água. O mano franziu o cenho e fechou a cara. Olhou nos meus olhos e subiu a mão pela testa descendo pela nuca à moda de quem assenta os cabelos. Mas a mensagem subliminar foi clara. Na gíria paranaense aquele gesto significava: “Deita o cabelo…” E assim, a contra gosto, tive que declinar e bater em retirada. Debalde foi o meu amor juvenil.