QUE HISTÓRIA É ESSA ?
De tanta gente lembrar de um episódio que aconteceu comigo, fiquei com vontade de parodiar o programa do ator Fábio Porchat. Vou contar um caso que todos acham engraçado, mas para mim foi bem desagradável. Estava em um momento difícil, pois tive de viajar para visitar uma amiga de fé, camarada, que estava pra morrer de câncer. Ela morava em Salvador. Tive de pegar avião que odeio e me deixou mais tensa, e ficaria hospedada em um condomínio de casas bem perto do mar e na orla do aeroporto da cidade.
Em viagem anterior conheci este lugar, mas fiquei pouco tempo e quase sempre na frente da casa, em um jardim de flores, quiosque e palmeiras, onde as pessoas recebiam as visitas para beber, conversar e jogar um carteado. Portanto, conheci pouco o interior da moradia. Desta vez, a minha anfitriã estava no hospital cuidando da irmã doente. Iria direto para o condomínio, e na portaria estariam avisados, poderia entrar direto para a residência pegando a chave na prateleira à esquerda da porta dos fundos. Na capital baiana, peguei um táxi e rumamos para o tal lugar. Achamos com facilidade o condomínio e passamos bem pela entrada com o táxi que foi parar nos fundos de uma das casas geminadas. Lembro que perguntei ao taxista se era o número que tinha dado e ele confirmou. Fui ao local e achei a chave. Tudo estava certo.
Assim que entrei tive a sensação que aquele espaço era um lugar diferente das minhas lembranças, mas a cozinha era exatamente igual, a geladeira embaixo da escada do andar superior e o banheiro, a sala de estar e um pequeno quarto confirmavam o endereço. Tinha gravado mais o espaço físico do que a decoração. Como poderia ter errado se encontrei a chave e estava dentro da casa? A hospedeira me autorizou a buscar toalhas no armário do banheiro de cima e que tinha comida na geladeira. Tudo estava conforme suas instruções. Fiquei mais tranquila e pensei em sair para um restaurante, mas não conhecia a redondeza e estava cansada, resolvi aceitar a sua sugestão e relaxar, pois teria um período atribulado pela frente.
O tempo todo que por lá passei, estava na sala e foi por lá que fiz o meu acampamento. Telefonei várias vezes e o telefone fora de área. Ninguém telefonava para mim. Tomei banho e fui à geladeira ver o que tinha para comer. Pouca comida o que me surpreendeu, dava para fazer um sanduíche, e com um pedaço de torta que atiçou a gulodice. Pensei: “só podia ser para mim.” Cheguei a tirar uma soneca no sofá da sala, e quando acordei mais disposta, fui para a frente da casa, abri as janelas e sentei no quiosque olhando o cotidiano dos moradores. Passou por mim o faxineiro que parou e falou comigo. Não estava surpreso. De novo tudo parecia normal. Tão normal, que nem me lembrei de perguntar a ele se estava na casa certa.
Mas, mesmo estando tudo sob controle ainda não estava convencida que aquele era o meu lugar. Por que ninguém fazia contato comigo? Era tudo um pouco esquisito. Aí comecei a olhar com atenção a decoração da sala. Tinha objetos religiosos que não conhecia, mas a mulher era católica. Mas o estilo e o modo de decorar não eram dela. O que mais me espantou foram os porta-retratos na estante com um casal, jovens e crianças que não se pareciam nem com a proprietária e nem com seus filhos e netos. O quartinho anexo à sala estava lotado até o teto de brinquedos. Notei que a porta de entrada para o quartinho era através da sala e eu lembrava que esta porta ficava colada ao banheiro e já na saída da porta dos fundos. A casa parecia ser de uma pessoa desmazelada que não tinha o perfil da minha conhecida. Que lugar era esse?
Comecei a ficar cada vez mais intrigada e, liguei para uma parente dela que morava em Belo Horizonte. Dei os detalhes e falei de meu estranhamento. Do outro lado da linha, a cunhada falava que o quarto deveria ser de uma sobrinha que tinha ido recentemente para lá. Não achou relevantes as fotos de desconhecidos. E, até esqueci de falar do detalhe da porta. No fundo percebi que ela tentou me tranquilizar. E, nem lembramos das pessoas conhecidas que poderiam ajudar. Depois que desliguei fiquei matutando:” mas como alguém podia imaginar que estava numa outra casa”? A situação era tão inusitada que não me ocorreu falar com a portaria, ou procurar umas senhoras que conhecia e moravam neste condomínio. Fiquei como uma pateta esperando uma solução de fora para o problema.
Foi anoitecendo e, de repente me assustei com o tilintar do telefone. Puxa! Até que enfim. Era uma outra moradora. Toda aquela situação inesperada seria resolvida. Soube que a anfitriã ligou para as duas moças que moravam no condomínio e solicitou que fizessem contato comigo. As duas tentaram, mas o telefone não atendia e a casa estava às escuras. Depois de um certo tempo deduziram que podia estar na casa ao lado. Telefonaram e foram me buscar, entrando às pressas pois a vizinha poderia chegar a qualquer momento.
Para aumentar o suspense, foi tudo rápido, mas, a verdadeira moradora chegou a tempo de fazer um confronto comigo que “invadiu” sua casa. Além de pagar mico, servi de bode expiatório pela irresponsabilidade das duas proprietárias. Finalmente, consegui entrar na casa certa, a casa do lado. Soube que a mulher queria inclusive denunciar a “invasão” para o síndico, mas foi dissuadida. Quem sabe não teve o bom senso de sacar que tinha metade da responsabilidade na invasão de seu domicilio? Ou queria me acusar de apropriação indébita? Quem sabe as duas não se deram conta, de que escondiam as chaves de suas casas, em um mesmo lugar e em casas geminadas? Não seria o caso de uma “invasão anunciada”?
Por fim, fora estes atritos de vizinhança tudo acabou bem. Que alívio! Entre mortos e feridos, salvaram-se todos.