DESAFIO & PRÊMIO
FRANCISCO DE PAULA MELO AGUIAR
Antigamente, se ouvia falar que o eleitor só ia votar depois que comesse farofa (farinha de roça) de água e sal, arroz branco e carne de boi. Tudo pago pelo candidato e dono do boi. Aí o eleitor ainda tomava uma "lapada" de água que passarinho não bebe e entrava na seção eleitoral para votar. Era a hora do voto em chapa de papel (com apuração manual). Ainda não existia nem internet, redes sociais, telefone celular, computadores, etc., porém, já existia o voto de cabresto e a língua da população botando e tirando defeitos e elogios nos candidatos e seus eleitores. Confusão que terminava na porta da cadeia em muitos casos.
Uma certa vez, a disputa de uma área pública onde foi construído um posto de gasolina, por pouco não terminou em homicídio...
A roupa suja era lavada nos tempos das campanhas eleitorais.
Na política os adversários de hoje serão os correligionários do amanhã... Um exemplo típico disso, um candidato que nunca tinha sido nada na política, mudou de lado e começou a falar contra a "hegemonia" do lado que serviu antes, ele era invisível perante o eleitorado, fez raiva aos antigos correligionários, disse gatos e lagartos e esses revoltados, deram-lhe uma “sova” e o cara passou a ser visível e ganhou a eleição por dois ou três mandatos e depois ainda aderiu ao partido político de seus algozes. Tudo isso é fato na política, não é folclore.
Antes do dia da eleição, o eleitor batia de porta em porta dos candidatos e seus cabos eleitorais pedindo favores. Os pedidos mais usuais naquele tempo eram: fotos para documentos, perereca, registro de nascimento, telha, vara, caibro, linha, prego, chave, torneira, vaso sanitário, porta, janela, tijolo, madeira, areia, barro, cirurgia, extração de dente, dente de ouro, passagem, corte de pano, corte de cabelo, saco de cimento, terreno no cemitério (sepultura), pagamento de taxa de água e energia elétrica, caderno e livros escolares, caixão de defunto, licença para construir, cachaça, cesta básica, medicamentos, sapato, chinela, cal, tinta, fumo, cigarro, compadre, camisa com a foto do candidato para toda família, mortalha, bola de esporte, padrão de camisa e de calção, ônibus para pagamento de romaria para Nossa Senhora da Penha e ou São Severino do Ramos, emprego, médico, dentista, advogado, etc. Era um Deus nos acuda. Ainda não existia a troca de drogas por votos, apesar de que já existir maconha, cocaína e seus derivados em abundância.
O eleitor simples nunca teve vergonha de pedir uma "ajudinha" aos candidatos para puder votar.
O eleitor que gostava de passeata brincava um verdadeiro carnaval fora de época todas as noites até setenta e duas horas antes do dia da eleição. Cachaça com força! Showmícios todas as noites com artistas e da vida alheia nos palanques.
As piadas da oposição e da situação, corriam à boca livre pelas ruas. Era com que a população lavava roupas nas pedrinhas da levada todos os dias... Deboche para criança não ouvir e de todas as cores partidárias. Fedia mas não incomodava.
Tenho lembrança de uma senhora que botava "coroa" de boi no marido e jogou uma piada contra uma senhora honrada e que votava em outro candidato que tinha perdido a eleição, que ao passar à frente da casa da mulher caridosa, ouviu a seguinte piada: "quem quiser um governador que corte um rolo de bananeira e leve para cama...".
Aí o bicho pegou, porque teve a réplica, "eu não preciso de governador sinha "p" e muito menos de rolo de bananeira na cama, tenho o meu esposo digno e honrado, agora você é que precisa "vaca" sem porteira...". Foram as tapas e morreram inimigas e os candidatos não tomaram conhecimento do ocorrido até hoje.
Então o cerne da escolha do candidato para votar passava, assim como atualmente passa pela cultura de um problema que é a situação específica em relação a cada pessoa/eleitor/necessidade, embora a verdadeira dificuldade é sem sombra de dúvidas as convicções individuais preconcebidas do eleitorado que bloqueia a própria liberdade de escolha.
Então o ato de escolher o candidato e votar é prêmio e/ou desafio? Porque o eleitor tem a “faculdade” de comer o boi com farofa e arroz e votar e/ou não votar no candidato depois...