AGUERRIDO E AGARRADO
Meu soar de pêndulo vacila, inquieta. Se desfaz em gotículas atônitas de um saber sonso, varrido, ofegante. Olho para as mãos e as vejo descortinadas, feito nuvens encardidas, feito rostos amordaçados. Retoco minha alma com pétalas roubadas de seres esquisitos, aqueles tais que povoam pesadelos a granel. Grito por socorro e nada vem. Preces seriam úteis para reverter a dor, ou o silêncio. Sou mais um vão esquecido no tempo, nas jagunças varandas do querer-bem desejado. Mesmo assim, sem pestanejar, retomo meu fôlego intempestivo e vulgar. Retomo minha ladainha rasteira, meu pomar de medos e poréns. Cada pétala agora é foragida do seu olhar. Cada engradado de sonhos se refez aguerrido e agarrado num flerte solitário, soturno e irritante. Por mais gostos que me tenha me untado, por mais folias que tenha o enredo escolhido, nada mais encanta, nada mais aquece. Essa fera que se refez em mim enrijece seu penhor, sua glória. Ela agora é mandatária nesse folhetim patético, nessa bagunça soluçante da minha fé. A quem pedir votos de perdão? A quem suplicar por mamadas inertes, roubadas de algum rosto qualquer? Mas não. Retomo aos cantos desarmados e volto à ribalta ainda mais serelepe do que nunca. Palavras se cospem retintas, remexidas, resvaladas. O texto se acanha, fica acuado, ressabiado. Daí só me resta assobiar algum suspiro fraldado, alguma lástima sorrateira, algum estopim venerado. Hoje sou rei, com todas folias e asseclas que couberem, com todas raças e dengos sorrindo para o além. Sou rei investido de tombos, sucateado de certezas, ajambrado numa compota de amores sacudidos. Sou rei pleno, gigante, generoso no ser e possuir. Que assim fique para sempre, nessa querela de vida que hoje se diz mãe, se diz pai, se diz Deus.