Participo de um grupo de pessoas que se conhecem, se gostam e não tem muita oportunidade de se ver de perto. Pairam nesse grupo, com o auxílio luxuoso da internet, lembranças de outros tempos, memórias que estavam escondidas mas que uma pequena fagulha basta para fazê-las novamente aquecer.
Esta eu postei nesse site da Vila Teixeira há algum tempo e agora retorna por uma menção do meu grande amigo e padrinho João Carlos Bersan(Carlão) e para quem tiver a paciência de ler ou reler:
Bem em frente à nossa casa, que ficava na Rua Paschoal Celestino Soares, 788, esquina com a Manoel Jorge de Oliveira Rocha, morava um outro grande amigo:
O Luizinho era zagueiro central de respeito do “Universal” e um exímio "baloeiro". No mês de Junho, saiam de sua cuidadosa lavra joias de diversos tamanhos e formatos.
Lembro de um desses balões, de 80 folhas de papel de seda e múltiplas cores, que ele sabia muito bem como combinar e que demorou mais de 1 semana para ficar pronto. Muitos de nós trabalharam para fazê-lo, sob as instruções do “engenheiro” Luizinho. E o toque final, que ele sabia como ninguém: o tamanho da boca e o conteúdo da tocha para dar o balanço correto e manter por muitas horas no ar esse "monstrengo" fascinante.
No dia de soltar, um certo domingo à tarde, houve uma reunião da turma do jardim para ajudar no que fosse preciso. A tarefa era dividida, alguns subiam no muro e alguém com uma vara segurava o bico, outros abriam com todo o cuidado o balão pela primeira vez enquanto ele próprio agitava com energia uma tampa de panela sob a boca do balão já posicionado, para insuflar o máximo possível de ar para o seu interior e, nessa hora, finalmente tínhamos a noção da beleza imponente e majestosa da obra do mestre Luizinho.
Acesa a tocha, após alguns minutos de espera tensa e com o balão já cheio de ar quente, havia um desafio final, que era o de saber o momento certo de ir soltando, com todo o cuidado e uma a uma, todas as pontas. Dava prá sentir nas mãos a temperatura que subia internamente e todos, em equipe coesa e disciplinada, obedeciam a voz de comando do Luizinho:
Carlão: segura mais um pouco; Rubão: solta; Jair: ainda não; Tedo: pode soltar; Miguel: espera eu mandar; Pedrão: solta; Dicão: segura; Má: OK; Zé Carlos: um pouco mais; Wanderley: solta; Lore: ainda não; Toninho: agora; Paulão: pode largar; Seu Aristides: pode soltar; Nissão (eu): solta; podem deixar que agora é comigo...
E ele ficava só, segurando sua criatura impressionante, já quase querendo levá-lo junto para o alto. Finalmente, ele a libertava para ganhar os ares e todos aplaudiam, inclusive a vizinhança em festa, que ficava acompanhando toda a movimentação. E lá ia subindo, subindo... Ficávamos algum tempo olhando, acompanhando aquele objeto majestoso, já misturando suas cores e levando para o céu um pouco de cada um de nós e muito do Luizinho. Cada vez mais para cima, para se misturar aos outros astros diurnos que ainda enfeitam o céu da minha memória.
Hoje não se pode mais fazer e soltar balão, o que é uma medida indiscutível. E, aos meninos de hoje é vedado produzir com as próprias mãos esse espetáculo de cores e vê-lo subir no mais alto patamar possível do orgulho próprio para, quem sabe, contar futuramente aos seus filhos lembranças como essa. Outros tempos...Paciência...
Mas eu prefiro pensar que essa proibição também é para que ninguém mais faça balões como ele, que saiu muito cedo da vida e do nosso convívio, com apenas 21 ou 22 anos, deixando tristeza e vazio em seu lugar.
Talvez onde esteja, ainda faça seus balões e essas novas estrelas, que de vez em quando algum astrônomo revela, possam ser produção do Luizinho...
Leonilson Rossi