Pequenas histórias 280
Para a Rosa Pena.
Como é difícil colocar no papel luminoso da telinha as palavras-imagens! Estou com umas encravadas na cachola que não sei como me livrar delas.
Já escrevi assim e assado, de traz para frente, de frente para traz, de revés, em círculo para direita, em círculo para a esquerda, reto, oblíquo, em retângulo, na vertical, na horizontal, em triângulo, espaçado, curto, largo, estreito enfim, de todas as maneiras.
Não consigo. Quer dizer, conseguir até que consigo, mas sai um texto frouxo, sem conteúdo, rebuscado, pior que rococó, não se entende, um texto pesado, cansativo, indecifrável, incompreensível.
Foi então que pensei numa coisa maluca. Pensei cá com os meus botões. Colocar-me no lugar da Rosa Pena. É! Da Rosinha, grande escritora, excelente cronista e escrever como ela! Não, nada de trocar de corpo, que isso! Chegar até ela e captar toda a essência literária dela, catalisar o humor, as palavras. Não, nada de escrever a La Rosinha, nada disso. Talvez me influenciar de Rosinha sem que venha com isso prejudicá-la. Coisa de louco, não é? Pois é.
Receber dela umas orientações de como consegue fazer com que as palavras venham até ela, e, não ela ter que ir até as palavras, como acontece comigo. Tem-se a impressão que a um gesto dos seus maravilhosos dedos, sem tocar no teclado, as palavras surgem espontaneamente, sem precisar escarafunchar os neurônios a procura de palavras, sem precisar ir até as profundezas da mente buscando as fujonas, sem que se precise amarrá-las fixando-as com ferro quente no papel telinha.
Como fazer isso? Tem explicação alguma? Não, não tem. Pois é!
O que tenho são imagens que se avolumam na mente. Passar para o papel em palavras é que são elas. Por exemplo.
Vejo um grupo de homens conversando, falando alto, gesticulando, vociferando como touros em arena de rodeio. Aí você pensa: estão discutindo problemas da firma, discutindo problemas graves, de difíceis soluções. Mas ao chegar perto, ledo engano. Estão discutindo é futebol nada mais. Então pensei: esses caras são capazes de ao verem a mãe ou filha se afogando, não deixam a discussão para socorrê-las. Foi nesse momento que surgiu em minha mente a cena:
Três ou quatros homens discutindo futebol. Nisso ouve-se uma voz infantil gritar:
- Socorro!
E o pai, que é um dos quatros, vira-se para filha se afogando e retruca:
- Filha, você tinha que se afogar justo agora?
- Socorro, papai!
- Olha filha, papai te ama, mas agora não posso de ajudar. Não vê que eles estão difamando o timão! Papai te ama, viu, mas preciso defender a honra do timão, certo? Então espere um pouco que já vou te socorrer.
Bom, é isso. Vamos discutir futebol que a vida é uma só e, danem-se os problemas fundamentais, o que eu quero é viver.
Beijos e abraços.