🔵 A ilha do medo
O objetivo era fugir do Carnaval. Fantasias, a música e a alegria de plástico poderiam ser trocadas por um retiro à base de cerveja, um feriadão longe da Capital e rock. Providenciamos o local ideal, barraca e partimos em dois casais para a “escondida” Prainha Branca.
De fato, a tal Prainha Branca era afastada. Difícil de chegar. Ônibus, trem, ônibus intermunicipal, balsa e trilha. Havia aquele sacrifício para desbravar uma prainha deserta. Depois daquela peregrinação, o que encontramos não foi um pedaço de areia inexplorado, ocultado por falésias e a Mata Atlântica. Para nossa surpresa, depois de vencer a Mata Atlântica, chegamos à sucursal da Grande São Paulo ou uma filial da piscina do Sesc Itaquera. Estava muito lotada, e não parava de chegar gente. A conclusão óbvia era que todos tiveram a mesma ideia: turistas querendo distância… de turistas.
A vantagem era que a praia era muito bonita e conseguimos escapar do Carnaval – em algum lugar tocava um disco do Steve Vai, esse som tomava conta de todo aquele trecho de litoral. Achamos um espacinho em frente ao Oceano Atlântico e levantamos acampamento. Se viesse um tsunami, assistiríamos resignados nossa própria morte, sem escapatória. Mas acordar pelo menos uma vez na vida com aquela vista valia o risco. Finalmente, tínhamos nossa “residência” com aquele quintal, em frente ao oceano ao som das ondas e Steve Vai – que tocava em “looping” eterno.
A rotina foi difícil, mas perfeita para quem estava disposto a abdicar dos confortos do planalto: tomar banho com água da montanha e viver a rotina de uma barraca. A adaptação ao novo dia a dia foi rápida.
Entretanto, logo pela manhã, depois de dormir ao som das ondas e Steve Vai e abrir a barraca pr’aquele visual de pintura, num passeio pela areia, havia um cadáver obstruindo o feriado prolongado. Infelizmente, lembramos de quem, no dia anterior, era apenas um bêbado muito louco com um copo na mão. Ele, talvez, entrou no mar naquele estado, e o mar o devolveu morto.
O acontecimento fatal derrubou nosso astral e estabeleceu como seria o clima.
Aquele final de semana era a configuração ideal para uma sequência trash de Sexta-feira 13. Em vez de uma cabana na floresta, uma barraca numa praia paradisíaca. Como, no final, apenas sobrevive o casal mais comportado, comecei a planejar como escapar dali, antes que começasse o massacre.
Ônibus urbano, metrô, trem, ônibus interestadual, balsa e trilha, na ida, era aventura. Na volta, o mesmo trajeto, apenas invertido, tornou-se interminável. Pelo menos o objetivo inicial foi alcançado: fugir do Carnaval.