As armas matam e a letalidade policial - um exemplo da mentalidade esquerdista.
Vinicius, encontrei-me, hoje, com aquele seu amigo... o... Esqueci-lhe o nome. Aquele esquerdista pé-de-chinelo, professor não sei do que. Há esquerdista de grife e esquerdista sem grife. O seu amigo é do segundo tipo; não tem onde cair morto. É um esquerdista vira-lata, e não dos de pedigree. Foi hoje cedo, um pouco antes do almoço, na praça. Eu estava, confortavelmente sentado num banco, a chupar um picolé de guaraná, e o seu amigo abordou-me, e cumprimentou-me. Não o suporto. Mas, tudo bem. Eu o cumprimentei. Desde que ele não me venha com bestice, eu o aturo. Mas ele decidiu provocar-me. Se me conhecesse, ele saberia que o bom-senso manda não fazer isso. Mas fez. Já estava feito. Agora, ele que aguente a coceira.
A conversa ia bem. Falávamos de futebol. Falávamos, até que passou por nós dois policiais, e ele decidiu falar do caso que há uma semana aconteceu com o Julião, que, reagindo a um assalto, matou os dois bandidos. Tomou um tiro no ombro o Julião, mas sobreviveu, graças a Deus. Você conhece o Julião. Lembra-se o que testemunhamos, na casa dele, no dia seguinte ao assalto? Estávamos, lá, além de outras pessoas, ele, o pai dele, você, eu, e o seu amigo esquerdista. Lembra-se do que o seu amigo perguntou ao Julião? Foi a pergunta que ele lhe fez: "Por que você matou os outros dois caras?" E o Julião, que é meio louco, respondeu-lhe, na lata: "Porque eram só dois!" Todo mundo captou a mensagem. E o seu amigo engoliu em seco. É, ou não é, louco o Julião?! Lembro-me do caso como se tivesse acontecido ontem. O seu amigo esquerdista empalideceu. O olhar dele, perdido. Calou-se. Mordia-se de raiva, com certeza. É louco, ou não é, o Julião?! Pois bem, Vinicius, o seu amigo esquerdista provocou a onça com vara curta. Disse, antes de condenar ao fogo do inferno o Julião, que armas matam e que a letalidade policial é um flagelo social. Falou que as pessoas não podem ter armas; que a legítima defesa, principalmente se quem se defende mata o bandido, é um ato de gente vingativa; que temos de desmilitarizar a polícia; que o assalto, que tem uma lógica intrínseca ao processo estrutural da sociedade, é laico; que os meninos - foi assim que ele se referiu aos bandidos -, os meninos, e os suspeitos, são vítimas de uma sociedade burguesa; que o Julião cometera um crime; e outras groselhas de igual teor. Perguntei-lhe, após ouvi-lo, a coçar-me o espírito o desejo de esmurrá-lo até ele pedir água, porque o Julião não podia reagir à ação dos assaltantes. E ele me veio com o rosário esquerdista, ladainha de fazer doer a cabeça de quem se dispõe a ouvi-la. Eu já não me aguentava. Falei-lhe que o Julião tinha o direito de reagir ao assalto; e que, segundo relatos de testemunhas, relatos que correspondiam, em tipo e grau, ao do Julião, os bandidos atiraram primeiro, e que, portanto, o Julião agira em legítima defesa. E o que me disse o seu amigo esquerdista? O que ele me disse é de fazer cair o umbigo: "Ao matar os suspeitos - assim ele se referiu aos assaltantes -, o Julião a eles se igualou." Tolo, o esquerdista! Quis lacrar, e entregou-me a munição que eu usaria contra ele. Perguntei-lhe: "Se o Julião igualou-se aos assaltantes, por que você condena o Julião e inocenta os assaltantes?" O seu amigo esquerdista, Vinicius, à pergunta que lhe fiz, fechou a cara. Mas não quis se dar por vencido. Descarregou sobre mim, uma vez mais, o rosário esquerdista. E agora com mais fervor. Não sei o que me deu hoje cedo. Em outras circunstâncias, se não estivesse de boa veneta, eu jamais permitiria que aquele esquerdista fizesse de penico os meus ouvidos. O embaraço dele livrou-o de ter o nariz quebrado pelo meu punho. Eu me divertia com o constrangimento dele. Perguntei-lhe se as armas matam. De sobreaviso, procurando por entrelinhas na pergunta que lhe fiz, hesitou; e ele não as encontrando, perguntei-lhe: "Se as armas matam, por que você diz que o Julião matou os assaltantes?", e eu mesmo respondi à pergunta: "Foi a arma que os matou, e não o Julião." Você tinha de ver a cara do seu amigo esquerdista. Ele se perdeu. Desorientado, fitava-me, e bufava. O sangue lhe subiu à cabeça. E o esquerdista nada me disse. Falei-lhe: "Para você são coitadinhos, vítimas da sociedade, criminosos com um histórico criminal que vai do Oiapoque ao Chuí, e criminoso um homem trabalhador, pai de família, que tem uma esposa com leucemia e duas crianças para sustentar. Por qual motivo, razão e circunstância você defende os meninos?", e com os dedos indicador e médio das duas mãos, enquanto falava meninos, desenhava no ar as aspas. E sabe, Vinicius, o que o seu amigo esquerdista me disse? Não. Não sabe. Mas imagina o que ele me disse. Foram mais ou menos estas as palavras dele: "Você tem de entender que os suspeitos tem ciência de que os cidadãos podem, agora, no governo do Bozonazi, usar armas, e de qualquer calibre, até metralhadora e fuzil, criar milícias, e transformar o Brasil numa terra sem lei, igual o Velho Oeste estadunidense. Esta nova realidade, somada à letalidade da polícia, os obriga a se armar para se protegerem da violência fascista dos conservadores. Se se desmilitarizassem a polícia e se se desarmassem a população, os suspeitos, que são, sim, vítimas da sociedade, e os pensadores confirmam, com estudos sérios, o que digo, não seriam tão agressivos, pois poderiam exercer, tranquilamente a sua profissão anti-fascista, o que..." Levantei-me do banco. Aguentei o quanto pude. Já ouvi as mais estapafúrdias asneiras, mas o seu amigo esquerdista extrapolou. "Você vive num universo paralelo?!", perguntei-lhe, e prossegui: "O que você tem na cabeça, paspalho?!" Virei-lhe as costas, e fui-me para longe daquele basbaque. Se eu ficasse, lá, na praça, a ouvir o seu amigo esquerdista, Vinicius, agora eu estaria atrás das grades. E nenhum esquerdista viria em minha defesa, afinal, eu não seria considerado um bandido do bem.