Luzes de néon
A vida anda meio morta, o tempo soa sua música fatídica e agonizante na minha cabeça... Os dias passam e deixam o seu rastro de mofo, angústia e imobilidade.
E eu ando absorto, meio dormindo, meio acordado, sem muita perspectiva, tropeçando como um bêbado nas sarjetas que formam o caos do submundo da alma das ruas. Ruas de concreto, lama e nevoeiro. Um ar inundado de vapores luminosos das luzes de prédios que pulsam como veias de néon na escuridão da noite.
Eu me perco nesses becos da alma, nessas ruas sem saída, impregnadas do cheiro forte de vidas extraviadas e de destinos mutilados. Noites que passam na minha cabeça como um sonho embriagado ou como um delírio lisérgico.
O quarto é quente como um túmulo e a lua, como um farol de incerteza, parece convidar ao abismo desses becos e dessas catacumbas urbanas. É um mundo de incoerência, de angústias sufocadas, de desespero tímido e silencioso pulsando nas trevas desses corações alucinados e já sem esperança ou bússola que os guiem.
O álcool já não entorpece a ponto de dopar o desespero e sanar a ferida que corrói a nossa alma. Já não há mais uma droga que possa sufocar esse grito que nossa mente brada dos cumes de um desespero que já beira a loucura. A loucura, em última instância, parece uma saída menos dolorosa que enfrentar o absurdo de cada dia, nessa luta insana por equilíbrio.
Com o pensamento longe, o coração golpeando o meu peito como um animal aflito, assim eu me lanço nessa selva de dentes de concreto. Assim, vivo por fora e completamente morto por dentro, meus olhos injetados de medo e tontura vagam vigilantes através desse pesadelo de carros, fumaça, luz e fuligem. Caminhamos atônitos, cada um carregando o peso irreal e insuportável de si mesmo, tentando a qualquer custo manter um mínimo de equilíbrio nessa insustentável leveza de viver.
O mais assustador é que, apesar de tudo, a vida se prolonga, vai se consumindo como uma vela na escuridão e no silêncio de um universo caótico, frio e indiferente. No entanto, não compartilhamos dessa serenidade e dessa indiferença cósmica que reina sobre os elementos. Somos frágeis. Sofremos, sangramos e caímos ao menor sopro dessa quimera que devora mundos e eras com a serenidade de um anjo.
O que resta a nós, perdidos e desajustados no mundo, é o doce abandono dessas ruas solitárias e sujas. É olhar com frieza e compaixão para essa beleza crua que emana de tudo aquilo que é simples, nu e selvagem. A beleza dessas ruas brilhantes, com suas poças cintilantes como pérolas num céu de asfalto na meia noite. O céu de chumbo ardendo em eflúvios de cores e vapores acima dos edifícios, acima das antenas e do zumbido estonteante das torres de rádio.
A poluição, o caos matutino e o pranto crepuscular do final de um dia pálido, oco e cansado. Como todos os outros dias que vieram e como todos os dias que virão, até que a pequena chama pare de queimar e só reste o fim, o começo, escuridão...