🔵 Um bom espetáculo
Cheguei no histórico teatro da PUC, o Tuca. Ao mesmo tempo, vinha o grupo musical, com visual típico de roqueiros. Tinha certeza que eu não havia errado, aquele ‘show’ mudaria minha relação com a Música.
Adentrei um ambiente novo, para mim, e estranho para os espetáculos musicais que eu conhecia, mas não hostil. Tudo era diferente e muito confortável, comparado aos festivais de estádios. Lá, sim, nos antigos estádios o território era hostil e tudo concorria para que o espectador vivesse a pior experiência possível. Mas, ignorando os obstáculos — talvez pela pouca idade, muita energia e disposição para enfrentar quaisquer autoridades e proibições —, aquilo era divertido.
Alguma mudança estava acontecendo. Cabelo bem penteado, bem vestido e comportado, parecia até que eu estava indo a um casamento. Mas não, ali era o teatro da PUC, mas a apresentação não seria associada a nenhuma manifestação estudantil. Acostumado a encher a cara com cerveja em festivais de rock, talvez fosse chegado o momento de degustar um café e mastigar um ‘croissant’.
Encontrei a fileira e minha cadeira na plateia. Em vez de AC/DC, Nirvana e L7, ouvia Gilberto Gil, Djavan e outros músicos que, ao invés de gritarem, apenas cantam. Enquanto lia um programa do teatro, relaxava ao som da MPB ambiente. E assim foi, até desligarem o som, apagarem as luzes, informarem as instruções de segurança, darem três toques sonoros e uma voz desejar “um bom espetáculo”.
O conjunto Boca Livre entrou no palco do Tuca e “destruiu”. Aquilo representou uma disrupção — ou um chamado — em tudo o que eu entendia como música tocada ao vivo. A partir dali, um semitom não seria mais tolerado e era hora de eu tomar uma atitude e aprender a tocar violão.
Saí dali sem tomar o café, mas crente de que a música boa e inspiradora não vinha de tão longe, como Seattle, e arremessada num estádio de futebol para uma multidão ensandecida; poderia estar aqui no Brasil, num teatro de Perdizes ou num barzinho do Bexiga sendo executada para um auditório bem comportado.
O grupo sempre me remeteu a um passado distante. Quando, no rádio, tocavam boas, contudo velhas canções, vinham como algo empoeirado. Entretanto, na década de 90, na casa da minha irmã, assisti a uma rápida entrevista, bem como a nova formação do Boca Livre, num programa de TV. Já não tinha ficado perdido no passado.
A apresentação do Tuca foi só a primeira que vi, depois fui a muitas.
Em 2021, a polêmica dessas vacinas e tudo o que envolve a polarização cindiu o Boca. Concluindo: aquela reformulação do conjunto, nos anos 90, ficou muito no passado, empoeirada.