Tique tac...
Mais uma vez sentada esperando ser chamada no médico. Serei chamada e com 5 minutos de consulta terei mais uma receita de remédios. Remédios que maquiam, desfocam, enganam a dor. Eu quero a cura. 22 anos de depressão, abismos, quedas. A cura, a cada consulta, se mostra mais distante e irreal. Não quero ser um produto do meu meio, não quero ter no meu corpo e alma cicatrizes que um pai tirano me deu. Não quero mais ser a guerreira, a que sobreviveu a um relacionamento abusivo. Eu não sou o resultado das tragédias que eu superei nem das que ainda faço de conta que venci. Eu quero viver a leveza da liberdade. Não quero mais ser sufocada pelo preconceito e pela crueldade da misoginia que me cercam desde a infância. Preciso que o peso de tudo isso saia de mim. Tem dias que tudo vai bem, quase nem me lembro. Tem dias que sou invadida, violada pela dor.
Já sai da consulta. Daqui 50 dias tudo se repetirá naquele consultório. Estou cansada.
Como se cura a dor? Como se libertar de traumas?
Tic tac tic tac. O tempo cada vez mais curto rasga minha pele e a porta cada vez mais estreita limita meu caminho...
Tic tac tic tac...