O início do fim
Ele disse com todas as palavras que restavam, "Eu te amo, amo mesmo! Nunca falei isto tanto para uma pessoa". Mensurou todos os tipos de gostar que já haviam percorrido seu ser para mostrar, ou ao menos tentar, que o que sentia era diferente. "Como era difícil deixar as coisas claras!", pensava... Toda a vez que tentava uma batalha titânica ocorria dentro de seu ser. Queria sempre tê-la por perto, e ela, em seus dilemas de 8 ou 80, sempre o punha diante de dilemas também. Então, oferecia uma saída gentil, "se quiser ter minha amizade, tudo bem, não teremos mais sexo. Senão quiser, tudo bem também, não teremos nada". Era difícil acreditar em si mesmo, mas era isto. Tinha um objetivo agora, mudar a imagem que criara de maneira involuntária para todas as pessoas que gostara. Recorreria, inclusive, a terapia. Gostar de sexo não quer dizer que a vida gira em torno do sexo, mas era isso o que todos pensavam. Isto o fazia mal, não só a ele, mas para todos os que faziam parte de seu círculo íntimo.
Ele era um cara ciumento como qualquer ser provido de sentimentos criado em uma sociedade machista. "Morro de ciúmes, mas morro só", pensava em sua luta individual contra o mundo que o criara. Sempre engolira seu ciúmes a seco para que ela tivesse as experiências que quisesse. Ela deveria ter as amizades que quisesse e o eventual relacionamento com quem desejasse. Era doído. No fundo era muito saber que ela fora atrás de outros, mas não a impedira nunca. Ela sabia disso e sempre contava com ele para socorre-la madrugadas à dentro quando precisasse. Ela o amava e ele também a amava, e por se amarem a única coisa que queriam, além da companhia um do outro era que se sentissem inteiramente livres na relação. E sabiam que, fizessem o quê fizessem, encontrariam apoio um no outro.
O desejo de ficar não era mais o mesmo. Não girava mais em torno de um pedido. Não havia mais querer. Mudança sempre trazem processos. Ele já mudara muito por ela, sabia que mudaria mais se os processos não tivessem tomado tal caminho. Um processo dói, não é possível saber em quem dói mais, mas o fato é que dói. Ele sentia a dor dos processos de mudança dela e sabia que estava chegando ao fim... Ele, em sua consciência, sabia que não era o que ela esperava para si, mas tinha a convicta certeza de que ela era o que desejara. Era preciso respeita-la e para isso sabia que sofreria...
Todo tragédia quando escrita se escreve no pior dos momentos de quem a vive. Era início de uma Pandemia, o mundo parara para enfrenta-la, o sistema de saúde era transformado numa máquina de guerra para o combate. Fazia pouco tempo que descobrira abaixo do escroto um caroço que crescia, gerava incômodo e doía. Justo nessa hora a vida o punha só, isolado e diante de um governo fascista que preferia socorrer bancos ao povo. Ele se preparava para o início do fim...