DOS LIVROS: DA BIENAL AO NOSSO PARADOXO CULTURAL
Nesse último Sábado, dia dois de julho do corrente ano (2022), por aqui se iniciou a vigésima sexta BIENAL INTERNACIONAL DO LIVRO DE SÃO PAULO , um belo evento cultural que conta com a iniciativa da CÂMARA BRASILEIRA DO LIVRO.
O início do evento foi um termômetro fidedigno do quanto a nossa sociedade, depois do auge da Pandemia do SARSCOV2 (ainda em vigência!) sente a necessidade de liberar a reprimida demanda por eventos culturais.
A moda agora é "imersão" em arte. O estrangeirismo mais ouvido por aqui parece uma ordem emergencial:
- Experience! A vida não pode mais esperar...
Na entrada inaugural do evento, que ocorre no "Expo Center Norte" até o próximo Domingo dia dez de Julho, a impressão que tínhamos era a de que se havia aberto as porteiras do isolamento social.
Curioso é que , por ali, o mundo seguia como se não houvesse amanhã, dado o imenso contingente de pessoas aglomeradas , a grande maioria sem máscara respiratória. Ninguém nem tocou nesse assunto supérfluo.
Afinal, para que ser um "chato da saúde" num momento glamuroso desse, não é?
Talvez tenha sido, embora aqui não seja o mérito "paradoxal" do meu assunto, o primeiro paradoxo que notei: O SANITÁRIO.
Uma vez que , até outro dia, em eventos bem menores como foi o sobre História da Arquitetura Brasileira lá na Bienal de Arte, nos era exigido proteção respiratória; e ainda em outros menos recentes, exigia-se a comprovação da vacinação para Covid 19. Mas com- eleição a vista!- tudo ganha maior ou menor dimensão...ao gosto do "eleitor de peso".
Viroses a parte, a Bienal Internacional do Livro está culturalmente emocionante.
Na maior livraria aberta da América Latina -como dizem!- logo somos surpreendidos e recepcionados com uma viagem à querida Terrinha- PORTUGAL, nosso convidado de HONRA- feita naquele famoso bondinho amarelo que nos leva aos mais altos e principais pontos turísticos de Lisboa , sob a terna brisa do "Além-Tejo", no suave deslizar dos trilhos, em meio a pavimentação viária feita com cerâmicas portuguesas; e de sobra, com direito a se ensaiar um cafezinho na poética e já tradicional companhia de Fernando Pessoa, em meio aos consagrados textos viscerais de Saramago.
E claro, sempre a se sacar uma boa " self foto" para a posteridade das surrealidades. Afinal, estamos no século XXI.
De repente, como "navegar sempre é preciso", o bondinho ganha os mares dos Açores e da Ilha da Madeira, numa exposição insular de textos informativos sobre toda a Cultura da região, bem como de sua bela, rica e única biodiversidade, tudo retratado em belíssimas e singelas aquarelas dos artistas da região.
Outro ponto Cultural Marcante da Bienal , deveras emocionante, é algo puramente autóctone, lindamente brasileiríssimo e bem simbólico ao foco urgente do nosso momento: uma ATENCIOSA homenagem À INFÂNCIA, numa belíssima cenografia arranjada num castelo medieval, algo dirigido às crianças de todas as idades, onde toda a turma do Maurício de Souza viaja, a encenar o adorável legado do artista, em apresentações e leituras de histórias dirigidas aos espectadores mirins.
Amei. Algo de tocar nossa perene alma de criança. Até conversei, em silêncio, com o coelhinho da Mônica e peguei o Cebolinha em mais um plano infalível, sempre falível para ludibriar a esperta dona do "PET".
Pude, inclusive, visualizar o Maurício logo ali, a papear numa sala privada do seu evento, no auge de sua disposição de vida.
Arte...de fato, é garantia de qualidade de vida longeva!
E a feira segue...dentre "comes e bebes", mil aromas difundidos e muitos lançamentos de arte literária, inclusive muitas delas repaginadas para as telas cinematográficas.
Faço aqui alusão ao lançamento do livro de amigos- "UMA MISSÃO QUASE IMPOSSÍVEL"-SCORTECCI EDITORA , de Liana Gottlieb, coautores Paulo Saldiva, Pedro Sérgio Pereira), com ilustração maravilhosa de GIBA CARTUM: uma linda fábula escrita para crianças, que desenvolve a inteligência emocional para a BOA CONVIVÊNCIA , também a educar e elucidar, através de informações científicas e históricas, a importância de precocemente ensinarmos às crianças o prezar pela Sustentabilidade Planetária para a consequente humanização da VIDA na Terra.
Quem me lê deve estar se perguntando: e qual é o seu paradoxo em epígrafe, afinal?
Vou tentar resumi-lo : O tão alto grau dum intelectual evento literário em contraste com a gravíssima situação de IDH da INFÂNCIA BRASILEIRA. E de tudo que a cerca! Foi o que me tocou PROFUNDAMENTE.
Faltam atenção das políticas públicas, escolas, educação, alimentação, saúde, moradia, família...E FAZ MUITO TEMPO.
Tal é antigo entre nós.
Acumulamos um passivo social insustentável advindo do crônico abandono.
Segundo pesquisas sociológicas recentes, divulgadas pela imprensa, perdemos CAPITAL HUMANO a olhos vistos.
Em média quarenta por cento (40%) de déficit de aquisição de conhecimento otimizado possível durante toda uma vida.
A Pandemia turbinou nosso déficit sociológico, inclusive.
Os cérebros, aos quais a chance de desenvolvimento lhes foi dada, estão em fuga massiva para o exterior.
Os analfabetismos absoluto, o funcional e tantos outros- mais o tudo tão triste da cegueira e prisão social deles decorrente- estão alarmantes e preocupam inclusive os Homens "além fronteiras", dizem as notícias.
Temos o mais belo, completo e poético Estatuto de proteção à Criança e ao Adolescente( ECA) mas , ao que tudo indica aos nossos olhos ESTUPEFATOS, o documento não sai das letras lançadas sobre o papel.
Deduzo que talvez não haja leitores suficientes que interpretem corretamente o que ali está escrito.
Deve ser do consequente círculo vicioso do descaso, do abandono com "o futuro", o que dificulta a LEITURA DO MUNDO E DO ENTORNO. Multiplicamos ineficiências sociais.
E assim, duramente aprendemos que de nada adianta comemorarmos dois centenários da Independência Administrativa na sincrética Bienal Cultural do Livro, porque sem educação continuamos- todos!- socialmente "algemados" e a anos- luz de distância do real desenvolvimento humano sustentável.
Posto que só o cuidado primoroso com a infância abre a PERSPECTIVA, ORA PERDIDA, de real liberdade para se navegar precisamente pela tão complexa imprecisão da vida.
Esse é o nosso PARADOXAL LIVRO SOCIOLÓGICO , o mais triste que escrevemos ao longo da nossa recente História do Brasil e que, com toda certeza, deveríamos nos envergonhar de levá-lo às prateleiras das nossas SUBSEQUENTES "bienais das tantas tenras vidas esquecidas".
Vidas de possibilidades para sempre perdidas, como páginas existenciais em branco, ao léu dum tão longo tempo d e invisibilidade, onde nada de mais nobre pode ser escrito.
Quiçá -um dia Brasil!- consigamos "escrever e ler" nossas melhores biografias sobre o todo , que fale do nosso apreço conosco, nesse sempre tão sofrido cenário que ainda hoje, infelizmente, permeia nossa querida Nação.