Queria escrever uma crônica que chamasse a atenção dos que se sentem vazios. Solidão empurra ladeira abaixo e arrasta o que sobra. E não é vazio de conhecimento, informação e conteúdo, é de esperança, a única salvadora da Pátria.
Seria algo que os preenchesse, de modo particular e não restasse nenhuma brecha pra absorver sentimentos de dor ou culpa. Na lei da atração somos impelidos.
Que ao lerem, fossem transportados para Paris, diante da Torre Eiffel, e entusiasmados com a beleza do local, escolhessem uma moldura humana para enquandrá-lo. Viagens são tesouros impagáveis.
Que fossem abduzidos pelos personagens da Disney, em Orlando, para participarem de um desfile de fantasias onde o conto de fadas fosse verídico e fizessem parte do elenco, como personagens principais. Na casa do Michey a porta vive aberta, pode entrar.
Uma crônica que seduzisse o Tenório, marido de Tereza, para que deixasse o futebol de lado e fosse com ela para o campo de concentração.
Que tirasse o Juninho da televisão e o levasse para o mundo que o aguarda lá fora: sem telas, sem nudes, sem fest-food, sem amigos. Sem imagem vegetativa.
Uma crônica que sabotasse o negativismo estrutural e trouxesse de volta a sobriedade. As pessoas não abusam do álcool e drogas por bem prazer, por vezes, alimentam-se da ilusão de não serem o que são, por alguns minutos. É esconderijo.
Que atraísse os olhares apaixonados de Maria e desse a ela coragem para se revelar em sentimentos diante de Pedro. Amor guardado na gaveta não veste o mundo.
Uma crônica que fizessem dormir os pesadelos e acordassem os sonhos na hora certa.
Queria escrever uma crônica que acolhesse o mundo doente, e fizesse nele uma intervenção cirúrgica, retirando seus tumores.
Que devolvesse a alegria sequestrada pela morte de Adolfo, à Donatella: um amor igual ao dela, nunca vi pintado, quem dirá vivido.
Que trouxesse flores naturais imortais pro Olimpo, raquítico, na cama de um hospital.
Na verdade, queria escrever uma crônica que fizesse cócegas na humanidade e o sorriso fosse característica e não resposta.
Queria mesmo era mudar o mundo, mas só consigo consertar o zoom da minha máquina velha, que trago pra muito perto, e inevitalmente, desfoco a imagem.
Queria escrever uma crônica que mudasse o mundo, mas ainda não aprendi a juntar palavras que arrastem. Porque os gritos silenciados só são ouvidos nas entrelinhas.