O café é um dos poucos produtos que representam o Brasil com magnitude. É uma espécie de gambiarra universal. Se está com sono, café! Triste, café! Deprimido ou alegre, café. É símbolo de encontro, de saudade, de maturidade. Se não toma café, a vida está fácil!
Lembrou-me de Merces, a doninha do Sr. Francisco que morava do lado da escola, quando acolheu opai, que no estágio em que se encontrava, precisava de cuidados paleativos. Seu Vicente era porteiro. Vira e mexe saia de fininho pra recolher o Seu Valmor das fugas do Parkison e do Alzheimer. Em nossa cabeça eles eram ladrões e o vozinho, o sequestrado.
Certa feita, ele veio até o portão com uma xícara de porcelana na mão, pedindo ao Sr. Francisco café. Ele parecia um menino! De repente aponta Merces e em fuga a xícara cai trincando-se. Merces, possuída pela raíva, esbravejou:
- Será que não vai vingar nada depois de sua vinda pra cá, pai? Até a xícara de estimação de mamãe está trincada. Eu não suporto mais...
Das grades do portão víamos Seu Valmor agarrado à xícara trincada como se fosse um brinquedo, acolhendo-a no peito, dizia baixinho:
- Eu não queria te machucar, amor. Logo depois, entoava uma canção de ninar.
De lá pra cá, xícaras trincadas não servem nem mesmo de vaso de flores. As folhas desaguariam com a lembrança ou as raízes secariam.