Mulheres da terra (parte I)

Este conto foi criado em homenagem a todas as mães e mulheres que residem nas zonas rurais do nosso Sertanejo Brasileiro.

Helen e Eloá brincavam no quintal fazendo comidinhas com as gramíneas que nasciam nos cantos das paredes, enquanto Helen se preocupava com a beleza dos pratos Eloá fazia sua massa de areia e saia arrancando as gramíneas para sua irmã enfeitar. O sol já estava em seu crepúsculo e elas sabiam que sua mãe Leonor estava próxima de chegar e que não ia gostar de vê-las ali sujando os talheres e os pratos da casa de areia. Como Helen era um ano mais velha com 10 anos de idade, tinha a responsabilidade de deixar a casa em ordem e orientar as tarefas enquanto sua mãe estava ausente. Mas pouco se tinha o que fazer na casinha, quase não havia moveis e viviam em uma viela de uma pequena cidade que aos domingos tinha como atrativo um coreto na pracinha depois da missa e um bar que todos sabiam que lá funcionava um prostíbulo.

Leonor fazia alguns serviços numa fazenda próximo dali e lavava roupas, trabalhos estes que não eram tão recorrentes. Era uma vida difícil, mas que os seus vizinhos não viviam tão distante da sua situação.

Leonor uma mulher de mãos calejadas, pés rachados, e pernas grossas das suas andanças, mulher e mãe solteira de poucas vaidades, seu marido a deixou prometendo voltar rico das terras do garimpo e nem viu a Eloá nascer. Mas nem por isso ela deixou de ser uma mulher forte e resistente das caminhadas da vida que acordava cedo todos os dias para ir trabalhar e não tinha medo das injustiças da vida, uma mulher de pouca fé, mas que sempre acreditou que através da sua força de vontade e trabalho poderia construir a vida de suas filhas. Apesar das dificuldades nunca tinha deixado faltar comida dentro de casa. Quando muito pouco pelo menos tinha farinha de mandioca e ovos em sua casa que ela trazia da fazenda onde trabalhava.

As filhas ainda estavam dormindo e o sol nem tinha aparecido quando Leonor estava a caminho da fazenda, deixava pronto um mingau e uns pães ressacados para o café das suas filhas. Ela ia trabalhar satisfeita mesmo sabendo que a caminhada era longo até a fazenda e que muito provavelmente só voltaria a noite, contudo ela se sentia recompensada.

Eloá era sempre a primeira a se levantar pós a saída de sua mãe e fazia questão de arrumar a mesa mesmo que com uma toalha com furos e desbotada, colocava as canecas, pratos e os talhares, além de todos os dias arrumar sua cama, ela gostava de ver a casa sempre organizada e sempre sonhou em criar alguma coisa que fosse mudar suas vidas. Já Helen estava enjoada de comer todos os dias a mesma coisa e apesar de não saber no que sua mãe trabalhava ela tinha uma forte vontade de acompanha-la, por outro lado era seu dever cuidar de sua irmã e ajudar na limpeza dentro de casa, coisa essa que não a deixa satisfeita. Assim começava o dia delas, também não eram proibidas de sair caso houve uma necessidade, já que poderia acontecer algum imprevisto e não tinha ninguém cuidando delas na ausência de sua mãe.

Elas tinham terminado de tomar café e Eloá estava muito reflexiva e em silencio limpando a cozinha e tinha começado a observar um caminho de formigas indo e vindo na parede e ela seguindo com os olhos uma trilha que parecia infinita que desaparecia por debaixo da porta. Eram grãos brancos de farinha que elas carregavam que sua irmã tinha derrubado mais cedo da mesa. Ela ficou admirada porque tinha varrido antes, mas as formigas insistiam em catar os espalhados e fazer sua trilha novamente. Até que Eloá perguntou. – Vamos brincar de fazer bolinhos? Enquanto varria o chão e olhava para sua irmã Helen limpando a mesa.

Logo Helen não concordou com Eloá e disse, – Mamãe falou que não é para gente brincar de fazer bolinhos porque o quintal fica todo sujo de lama depois, e a gente nem terminou de limpar as coisas. Eloá parou o que estava fazendo e disse: – Não Clara, não vamos brincar no quintal, vamos fazer na cozinha, vamos fazer de verdade. Vi que tem alguns ovos, farinha e açúcar no armário e pense que podemos vender e ganhar dinheiro para ajudar mamãe.

Inicialmente Helen estava resistente mas acabou concordando com sua irmã, pois no fundo ela estava cansada de fazer as mesmas coisas todos os dias e viu uma maneira também de ajudar sua mãe que era uma coisa que ela queria muito. Clara havia lembrado de ver Leonor fazendo algumas coisas em casa, juntou os ingredientes que tinha e começaram a fazer a massa com a farinha de mandioca. Uma coisa que elas descobriram enquanto estavam fazendo, foi que não sabiam quando a massa estaria pronta. Nessas alturas a cozinha já estava uma bagunça e os bolinhos nada de ficar pronto com tudo sujo e com caras de insatisfação. Melhor a gente voltar a fazer bolinhos de terra. Disse Helen para Eloá que estava com a suas bochechas e cabelo sujo de farinha e sem ligar muito para o que tinha acontecido pegou uma massinha de farinha e tacou em sua irmã que revidou em seguida com muitas gargalhadas.

Outra coisa que elas não imaginaram foi que sua mãe chegaria mais cedo naquele dia e não seria nada agradável encontrar toda aquela bagunça depois de um dia de trabalho árduo na fazenda. Leonor reclamou as duas filhas e nem foi muito pela bagunça, mas pelo desperdício dos alimentos que era pouco e muito trabalho para conseguir. As meninas ficaram chorando pedindo desculpas, então Eloá falou que a culpa era dela, mas só queria ajudar vendendo as bolachinhas de goma na rua. Leonor estava realmente irritada, porém ao ouvir isso, mandou as meninas irem tomarem banho e foi ao seu quarto para que as suas filhas não a visse chorar sentada na cama. Ela estava emocionada pelo fato de as meninas de alguma forma querer ajudar.

Tinha passado alguns minutos e Leonor enquanto limpava a sujeira estava pensando no que Eloá tinha falado para ela. E ao terminar de arrumar a cozinha ela chamou as meninas para conversar. O engraçado foi que as suas filhas não vieram apreensivas por mais alguns sermões. Então sua mãe resolveu quebrar o silencio e falou: – Eu estava pensando na ideia de vocês e acho que podemos fazer biscoitos para vender. Mas como acabou tudo e só temos a farinha preciso trabalhar alguns dias lá no sitio para gente fazer, mas claro, sem bagunçar a cozinha. As meninas se entre olharam e soltaram um sorriso olhando a sua mãe com cara de cansada, então logo pediu que elas fossem dormir.

E como sua mãe tinha dito, depois de alguns dias de muito trabalho conseguiu os ingredientes e num belo dia de domingo chamou as meninas para fazer a massa e levar os biscoitos ao forno. Desta vez sem muitos problemas. Talvez fosse uma grande vitória para Eloá que viu o cheiro dos biscoitos ecoar pela casa e fugindo pelas brechas dos telhados, pela porta e janelas. Estava a navegar pelos seus sonhos de menina, um deles era de ter uma bicicleta. Ela estava confiante enquanto Leonor só queria mostrar as meninas que não ia dá nada certo, porém que no final seria algo divertido na tentativa de vender nas portas e na pracinha no dia seguinte. Por sinal os biscoitos não estavam tão saborosos como gostariam, mas sabiam que era o que dava para fazer com os ingredientes que tinham conseguido.

As meninas estavam animadas e já queriam vender naquele mesmo dia. Sua mãe disse que tudo bem desde que voltassem antes do escurecer e que não saíssem da região da igreja. Então elas foram, passaram a tarde tentando vender sem muito sucesso, pois o povo reclamou que estava muito dura as bolachas de goma, Clara já não tinha mais a mesma energia de quando começou e Eloá voltava pensando em algumas ideias que pudesse melhorar e também procurar outros lugares que pudessem vender porque por ali já havia bastante barraquinhas espalhadas esperando o final da missa.

Logo Leonor perguntou a elas como foram de vendas, mas pela cara das meninas sabia que não foram bem. Leonor disse para elas que tudo bem, que tinham outras coisas para fazer e que esquecessem essa ideia, pois vender não é fácil e que tomassem café com as bolachas. Eloá colocou a sua mão no bolso e puxou algumas moedas que tinha conseguido com o pouco que tinha vendido juntou com as de Helen e sem falar nem com sua mãe e irmã resolveu ir comprar banha de porco para pôr na receita no dia seguinte. Naquele dia ela foi dormir ansiosa.

EdCsilva
Enviado por EdCsilva em 28/06/2022
Código do texto: T7547657
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