VIDE BULA

Texto publicado originalmente no livro do autor de titulo “Hacasos” ed. 2016

Desde criança, assim que fui apresentado às primeiras letras, tenho muito apreço pela leitura. Uma das primeiras coisas que li, bem antes da Cartilha Sodré, aquela concorrente da Caminho Suave, foi o Almanaque do Biotônico Fontoura que trazia as aventuras do Jeca Tatu, se bem que ainda só via as figuras. De lá para esses tempos atuais não parei mais. Passei a ler de tudo, até para saber o que presta e o que não presta, contando os jornais e as revistas, literatura de banheiro, aquelas frases que escrevem nas portas dos sanitários públicos, receitas de culinária, regulamento de promoções, manuais de montagens, listas telefônicas, embalagens de produtos, anúncios fúnebres, até Bruna Surfistinha.

Na minha infância li muitos Gibis, às escondidas, já que naqueles tempos os quadrinhos eram mal vistos pela escola e pelos pais. Em compensação li O Pequeno Príncipe, Reinações de Narizinho, A Ilha do Tesouro, Robson Crusoé, entre tantas obras para a petizada, todos os livros eram emprestados ou retirados na biblioteca. Ai chegou a adolescência e ficar apenas em Dom Casmurro, A Moreninha, Meu Pé de Laranja Lima era pouco, então, além dos famosos Catecismos do Carlos Zefiro, tive a curiosidade em acessar as obras de duas escritoras consideradas malditas nos anos de chumbo da ditadura militar instaurada no Brasil, Cassandra Rios e Adelaide Carraro, que de certa maneira à época aguçavam o imaginário da meninada.

Fui crescendo e vieram então O Cortiço, O Crime do Padre Amaro, o Primo Basílio, 1984, Admirável Mundo Novo, Triste Fim de Policarpo Quaresma, Crime e Castigo, Amor de Perdição, Os Lusíadas, A Divina Comédia e uma infinidade de outras obras menos famosas. O que não gosto mesmo é de ler textos de autoajuda, tenho aversão, porque literatura não é obra de caridade e se algum autor quer ajudar que faça um trabalho voluntário, distribua seus livros de graça. Confesso li muito, mas deveria ter lido muito mais e, de todas as leituras, eu pensava que a Bíblia fosse a obra mais difícil de interpretar, tanto que por vezes encontro dificuldades e pouco ouso botar os olhos, é confuso.

Agora, com o avanço da idade, o que mais tenho lido é a famosa obra Vide Bula, aquele encarte que vem nas embalagens dos medicamentos com umas letrinhas dignas de usar lupa, trata-se de uma leitura chata, carregada de palavras estrangeiras e altamente técnicas, não tem emoção, apresenta um enredo incompreensível e afirmo categoricamente que o texto é de difícil interpretação, tanto que leio várias vezes e continuo sem entender nada.

Samuel De Leonardo (Tute)
Enviado por Samuel De Leonardo (Tute) em 27/06/2022
Reeditado em 27/06/2022
Código do texto: T7547355
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