A ADOLESCÊNCIA NARRADA PELA INOCÊNCIA
Comecei a escrever diários no período de minha já longínqua adolescência, pois a precoce paixão pelas letras nasceu-me com as primeiras leituras das revistas em quadrinhos, das obras de Monteiro Lobato, Júlio Verne, Sir Arthur Conan Doyle, Agatha Christie, Raquel de Queiroz, Machado de Assis, Davi Nasser, Eça de Queiroz, Érico Verissimo, José de Alencar e inúmeros outros autores que nortearam e organizaram o destino dessa incontrolável e intensa paixão literária me borbulhando n'alma.
Neles eu anotava a beleza das garotas, seus lindos sorrisos, namorava-as através dos textos, registrava sonhos e devaneios, desabafava, chorava as desilusões, gritava as tristezas, rabiscava sobre os festejos da paróquia, os folguedos juninos, os pastoris, os primeiros e afogueantes flertes, os desejos, as frustrações, os desfiles carnavalescos, o encanto feminino a me fascinar, a utopia de voar, de um dia a ser escritor...tudo, sim, tudo. Cadernos e mais cadernos preenchi com veleidades, até mesmo meras folhas de papel serviam para expressar meus pensamentos. A adolescência narrada pela inocência da incipiente iniciação beletrista, segredos bobos e ingênuos a ninguém revelados, textos desencontrados, entorpecidos, cândidos, tortos ou nivelados por lágrimas, risos e anelos.
Meus diários rabiscados, toldados, escondidos dos curiosos, ocultos, companheiro da solidão e dos sonhos tão constantes no coração, preciosidades cúmplices de ideias, compilação de frases de para-choques de caminhão, onde também se amontoaram as poesias singelas, os contos fantásticos, as crônicas juvenis, as dissertações, as narrativas e demais caprichos e inspirações do menino aspirante a intelectual.
Deleitava-me escrevendo nos diários que o tempo, as circunstâncias, as intempéries e o destino apagaram, rasgaram, fizeram desaparecer nas gavetas do passado. Alguns as traças consumiram, os ratos roeram, as baratas usaram como esconderijos, mãos insensíveis jogaram no lixo. Todos se foram, todavia não passaram por minha vida em vão, serviram ao nobre objetivo de ensinar àquele rapazinho com espinhas no rosto como devem ser tratadas as palavras.