A morte do Grilo
A gente faz as coisas sem pensar. Por exemplo, matei um grilo agora há pouco, aplicando-lhe uma esguichadela de veneno SBP Multi.
Admito que o grilo, coitado, não havia me feito nada de mau, simplesmente havia repousado sobre o box do banheiro a me observar por um longo tempo fazendo força, sentado na retrete enquanto lia absorto uma obra da Publifolha chamada “Teoria Quântica”.
Por óbvio, até então, não o havia notado, apenas percebi seu corpinho verde, uma obra prima da engenharia natural, quando me ergui para limpar o rabo. Daí, me assustei moderadamente, pois pensei que fosse uma barata, aliás, seria muito mais plausível ter sido uma barata, porque faz calor, e muitas delas migram desesperadas, procurando novas terras, por causa da dedetização feita em todo o prédio no dia anterior.
Mas, definitivamente não era um destes seres repugnantes, se tratava sem sombras de dúvidas de um jovem e improvável grilinho, que teve a desdita de revelar-se a mim, um homem do meu tempo, profundamente perturbado pelas altas temperaturas, assustado com tanto bicho que aparece, um verdadeiro “inseticida” neurótico e irreflexivo – apontei-lhe o jato nocivo e segurei o gatilho com o indicador, rapidamente ele despencou do vidro do box e no chão, foi reduzindo aos poucos os movimentos de seus longos apêndices, para enfim jazer estatelado, verde e inocente...sentindo-me consternado, cuidadosamente, envolvi seu corpinho em um pedaço de papel higiênico para depositar no vaso sanitário, onde pôde descansar eternamente.
Aquele bichinho tornara-se um mártir para mim, pois, em nenhum momento, mesmo quando agonizava sufocado pelo SBP, cogitou renunciar à esperança que a cor de sua carapaça simbolizava.