RELATO DE UM DIA MARAVILHOSO

RELATO DE UM DIA MARAVILHOSO

Neto chegou cedo ao hotel, embora fosse um sábado frio, chuvoso, apropriado para ficar em casa bem agasalhado e sem fazer absolutamente nada. Era o ônus de sua profissão, pois aos finais de semana quem descansa são os hóspedes e fregueses dos restaurantes. Esses fazem suas refeições fora de casa e Neto tinha consciência da importância do seu trabalho de cozinheiro. Além do que, o Sr. Nilton, seu patrão, havia programado uma recepção para alguns amigos e, para auxiliar Neto, chamara um funcionário que estava em período de férias. O cardápio seria churrasco para quarenta pessoas. O cozinheiro iniciou os preparativos para o evento, preocupado para que tudo desse certo. Foi logo picando os temperos, abrindo as embalagens de carnes e lingüiças, preparando o arroz a grega e demais itens do cardápio previsto.

Lá pelas nove da manhã chegaram os primeiros convidados: Fernando Picles, Osmar Batista Silva (Mazinho), e o ator Nuno Leal Maia. Apesar do tempo, Picles e Osmar foram caminhar na orla da praia da Enseada enquanto Nuno corajosamente caiu na piscina, nadou por meia hora e completou seu exercício nadando no mar. Miorim, Sérgio Heleno, Malagolli e José Volpe foram os próximos e sentaram nas cadeiras em volta das mesas e, como soe acontecer com velhos amigos, iniciou-se animada conversa, cada um contando e relembrando as incontáveis experiências de épocas passadas, bem como trocando informações sobre suas vidas nos dias de hoje. Coisas de quarenta, cinqüenta ou sessenta anos passados, sempre presentes nas conversas daquela turma. O assunto principal era as competições de natação e pólo aquático de épocas passadas, seus protagonistas e questões periféricas.

E assim chegaram Kalú, Juarez, Faleiros, Amorim, Mondelo, Darcy (sobrinho do saudoso Moacyr), Vladi, Zezinho, Beto Amaral, Eduardo Mariani, Eduardo Nogueira, Zé de Paula. De sua cozinha, Neto assistia um impressionante reencontro emocionado de velhos amigos. O senhor Nilton passou a ser chamado carinhosamente de Niltinho por todos, como se fosse um bando de garotos, esquecendo que ali estava uma grande mistura de profissionais aposentados e bem sucedidos em sua maioria. Mas à beira da piscina do Hotel Vicino Al Mare, no Guarujá, era claro que posição social e profissional era o que menos importava.

O motivo de tal reunião, Neto não sabia. Mas ficou bem claro na chegada do João Augustinho de Almeida, acompanhado de seu filho e do casal Martins, que o hospedava em sua casa. Visivelmente todo aquele movimento era uma homenagem a João, um ícone da Natação brasileira. Saudados por todos, João foi abraçado e recebido com muito carinho. Vindo dos Estados Unidos especialmente para rever os amigos de juventude, o clima emocional aumentou muito com a presença do homenageado. O que não impediu de ser chamado por apelido de João Cabide, como os demais. Galã, Piolho, Picles, Kalu, Zé Pouca Roupa, Camelo Doido, Volpina, Karamanduka, Bundola e muitos outros codinomes dos participantes. Outro momento emocionante foi a presença do Manoel do Santos Junior, recordista mundial dos cem metros livre na década de 60. Mas passou a ser o Maneco simplesmente. Rubens Mejias, o Galã foi um dos últimos a chegar.

Seguiram-se momentos de total descontração regados a uísque, cerveja e vinho. Houve até quem tomasse água e refrigerante. Formavam-se pequenos grupos de rodas de conversas. Reinava o espírito de confraternização, de cultivo da amizade, de união, de alegria, de renascimento e reencontro. E recordações de amados amigos que haviam desencarnado, mas estavam vivos nas conversas: Luís Sérgio, Moacyr Rebello, Dagoberto Battochio, Otávio Abrantes, Marcino Ferreira Filho, Bentes. Moacyr era lembrado por suas inúmeras aventuras, Luís Sérgio por suas características de galanteador, Marcino por seu nado borboleta, Dago por seus geniais projetos arquitetônicos, Otávio Abrantes pelo inesperado de sua partida. José Volpe, o decano de todo o grupo, do alto dos seus 94 anos contava muitas lembranças e era muito lembrado como grande goleiro de pólo aquático do Clube Internacional e da seleção santista dos anos 50 e 60.

Após todos se servirem dos pratos preparados por Neto, fez-se um silêncio enquanto os amigos se alimentavam logo quebrado por uma volta às conversas, pois havia avidez em colocar em dia as informações e programar novas reuniões.

Tudo indicava que a reunião havia alcançado um estado no qual não haveria maiores novidades.

Mas o real clímax da reunião ainda estava por acontecer.

Vladi e Niltinho, após sérios esforços, fizeram com que todos se calassem para observar a entrega de uma placa comemorativa da reunião, em homenagem ao João Augustinho de Almeida. Diante de todos, Vladi leu os dizeres gravados em uma placa muito bonita onde todos agradeciam, homenageavam e agradeciam a participação de João em suas vidas. Realmente, João é um ícone nas vidas de todos os presentes, tanto como atleta como amigo, como conselheiro. Aí sim a emoção subiu, atingindo um nível em que todos o presentes sentiram um nó na garganta e umedeceram os olhos. João recebeu o presente falando com a voz embargada, entregue por amigos também muito emocionados. Todos aplaudiram fortemente. Seguiram-se comentários concordando com a justa deferência feita a um amigo realmente muito especial. Comentário geral: foi um encontro maravilhoso!

Agora sim, aqueles senhores puderam conversar e trocar números de telefones, atualizarem informações. E um clima de alegria, de alma limpa, de satisfação e de resgate de passados gloriosos tomou conta do ambiente. Que prosseguiu até o início da volta para casa.

Neto, após limpar cuidadosamente a cozinha, já estava em casa.

Paulo Miorim, 06/06/2022

Paulo Miorim
Enviado por Paulo Miorim em 08/06/2022
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