SOBRE O MONSTRO DA ANSIEDADE

Ansiedade não é apenas um estado de espera, um tipo de vigília. É um transtorno, é uma fobia chancelada pelos órgãos internacionais de saúde. É um monstro que atravessa a porta e se instala ao seu lado, no sofá, enquanto você assiste seriados na televisão.

É o bicho papão, que resolve te acompanhar em todas as suas caminhadas. Não é uma companhia que te embala, contando aqueles doces causos de vó. Contra ele, dispomos de muito pouco. Uma droga de farmácia às vezes faz com que ele hiberne um pouco. Mas você sabe que ele continua a viver e ter essa ciência, faz você soar as sirenes antes da hora.

E sua casa é toda a morada desse monstro. E nela ele se sente anfitrião de festas macabras. E nela, se distrai e improvisa uma oficina. E tudo isso acontece ao mesmo tempo. E o tempo resolve te afrontar e não passa na hora marcada, e não bate seu ponto. E você se analisa por todas as réguas. E se coa por todas as águas. E nada mais se faz sedução.

E você espera pelo milagre. Mas ele não se faz carne. Sua súplica não atravessa a parede de nenhuma catedral. E você se alimenta de música. Mas ela não te faz dançar. Você tenta se alistar em cruzadas, as mais justas delas. E se sente o dissonante que desarmoniza a marcha.

Você se desespera e testa suas poucas esperanças. Se confessa com a ciência, com a filosofia e com algum tipo de transcendência. E você não se sente flutuando. Sente que o chão é toda a substância que te acolhe. E você se conforma. E se reforma. E se deforma.

Mas você teima e relata a existência de algum caminho. Não sabe muito mais do que isso. E você sabe que, ao inaugurar o passo, o monstro estará lá, com a inabalável disposição de te acompanhar. E você olha para ele e quase consegue sorrir. E você caminha e se afasta. E por algum minuto ousa confrontar o monstro.

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 04/06/2022
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