O VÔO DA MOSCA
O VÔO DA MOSCA
Eu me esforçava para entrar em sintonia de oração, tentando me livrar dos pensamentos fúteis, e quando já estava alcançado meu intento, ela passou frente à meus olhos, ziguezagueando, me tirando a atenção.
Era uma mosca bem pequena, que parecia estar querendo me provocar. Quando erguia a mão para afastá-la, desaparecia num vôo rasante. Peguei uma revista e tentei forçá-la a ir embora, sacudindo-a de um lado para o outro. Quando achava que estava livre dela, lá vinha a mosca, outra vez, como um relâmpago, zombando de minha lentidão.
Foi quando me lembrei do ventilador. Liguei-o, rapidamente, e como num passe de mágica, o inseto sumiu.
Sorri vitorioso. Esperei alguns instantes e desliguei o ventilador, porque estava frio.
Quando reiniciava minha oração, zum...Era ela outra vez, como numa declaração de guerra, apostando em sua velocidade. Peguei o lençol e me cobri, dos pés à cabeça, certo de que assim estava livre dela. De repente começou, como se estivesse dentro do meu ouvido, aquele zumbido infernal.
Pensei comigo : É guerra? Então espera aí.
Levantei-me, fui ao armário do banheiro e voltei com um inseticida spray. Apontei à minha volta e quando ia acionar o gatilho, ela pousou, suavemente, sobre a cama, como numa rendição incondicional.
Fiquei olhando a mosca, tão pequena e ágil, e, no entanto, fadada a uma vida tão curta de, no máximo, 28 dias.
Mas seus dias de vida eram preenchidos com uma atividade febril, que a levava, em velocidade estonteante, de um lado para o outro, em busca de alimentos.
Fiquei pensando que, nós, racionais, bem poderíamos imitar a mosca, em sua celeridade, na busca de meios que dessem sustentabilidade às nossas vidas, e não destruindo a natureza, fonte de nossos recursos.
Abaixei a arma e a mosca, dando sinal de paz, levantou vôo e foi embora.
Foi quando me lembrei da oração que não cheguei a iniciar.
E, enquanto meus olhos se fechavam de sono, balbuciei, meio que dormindo:
-Senhor, abençoa a mosca.