💊 Capítulo 2 — Hospitalizado 💊
Eu me sentia estranho porque eu era um estranho. Quando resolvi sair do quarto, não sabia que iria encontrar um lugar que, para muitos, funcionava como um clube. Mas era um hospital.
Aquele uniforme amarelo claro desbotado, somado à minha crescente dificuldade para caminhar, portanto débil, dava a impressão de ser um louco ameaçador à solta.
Fui ao salão central daquele andar do hospital. A escadaria havia sido dominada pelos fumantes e convertida num irrespirável, embora animado, fumódromo. A cada aproximação, crescia o que parecia ser a reunião de elenco do “The Walking Dead” ou qualquer outro filme de apocalipse zumbi.
Notei um inexplicável orgulho de quem estava institucionalizado. Essas pessoas faziam questão de demonstrar conhecimento de como as coisas funcionavam ali, o dia a dia, horários, atalhos e quem é quem. Eu só queria sair dali. Aquela não era a minha realidade. Ali não era o meu lugar.
Aos poucos, os pacientes voltaram para seus quartos sem precisarem ser chamados, conhecendo a rotina, respeitando o horário do café, dos remédios ou exames. Ainda refletindo como alheio àquilo tudo, concluí que, ali dentro como aqui fora, sempre os mais inseguros precisam de uma turma para se “garantir”. Naquele ambiente, esse local era o fumódromo.
Para muitos, aquela janela do 12º andar já significou a solução de todos os problemas. Para mim, aquela ampla janela me separara, temporariamente, de tudo de bom que já vivi e as escadas (ou o elevador), de tudo de bom que viria.
Ficamos eu e uma budista, que parecia ser a única pessoa não institucionalizada, não fumante, ainda com uma vida do lado de fora daquele hospital, por isso, alguém que me entenderia. A budista acertou ao oferecer o que julgou possuir de maior valor. Compartilhou um mantra: nam myoho renge kyo.
Para quem achou que o máximo que ganharia naquela escada era muita fumaça na cara, um mantra ofertado por quem queria sair dali, parecia íntimo, especial, raro e revigorante.
“Todos têm a capacidade de superar qualquer dificuldade e de transformar seu sofrimento a cada instante”.
(Pensamento budista)