Bolsa FamĂlia đ”
Cada estande ou palestra sĂł tinha um assunto: dinheiro; os papos com amigos e parentes giravam em torno de um Ășnico tema: investimento; eu gostava de visitar dois lugares: corretora e Bovespa; meu computador era ligado quando abria o pregĂŁo e desligado ao tĂ©rmino da transação de papĂ©is; bancas de jornal, programas de rĂĄdio e âsitesâ, praticamente tudo o que remetesse ao mercado bursĂĄtil era do meu interesse; atĂ© o âeconomĂȘsâ foi instalado no meu vocabulĂĄrio.
Entrei nessa no auge da crise de 2008. NĂŁo deixou de ser uma estratĂ©gia, pois o mercado estava em baixa (barato). Acontece que os outros investidores estavam saindo correndo, talvez da vida. Contrariando o conhecido âefeito manadaâ, o mercado acalmou. A longo prazo compensava.
O Mercado de Capitais era meu novo videogame, a diferença eram os valores que eu ganhava ou perdia em compras e vendas que foram realizadas com a volĂșpia e a facilidade de um toque no teclado do computador on-line. Eu fui um investidor classificado como âagressivoâ. Meus âday tradesâ (compra e venda) talvez revelassem mais um sinal patolĂłgico de ansiedade do que uma aversĂŁo ao risco de âdormir compradoâ.
Eu percorria corredores, entrava em estandes, assistia a palestras e pegava brindes na Expomoney, a DisneylĂąndia de um legĂtimo porco capitalista.
âInitial Public Offeringâ (IPO), dividendos, âday tradeâ, bastava decorar algumas palavras e expressĂ”es (vĂĄrias em inglĂȘs) e falar um âeconomĂȘsâ castiço e demonstrar alguma desenvoltura no universo de compra e venda de açÔes, para servir-se na mesa de cafĂ©-da-tarde que a corretora dispunha aos investidores. Para dispor do maravilhoso banquete, bastava mimetizar o Sardenberg ou, inclusive, a Miriam LeitĂŁo. Nesse debate, eu pude, enfim, aplicar meus conhecimentos da Crise de 1929.
Observando a voracidade como os outros investidores atacavam a mesa de comida, tive a absoluta impressĂŁo de que nĂŁo era sĂł eu que, apesar da roupa social, dava prejuĂzo Ă corretora. Acredito que naquele auditĂłrio sĂł havia picaretas fingindo ser Warren Buffet, inclusive a turma da mesa diretora. Nem alta da Petrobras e Vale eram mais importantes que aquele sanduĂche de presunto e queijo. Pelo menos naquele momento.
Ăramos uma turma brincando de gente sĂ©ria. Igual a polĂticos, fingĂamos estar preocupados com o futuro da nação. Na verdade, como interesseiros que Ă©ramos, tudo o que nos unia eram: a ganĂąncia, o medo e a fome.