sua melhor e maior qualidade
achava que ser uma pessoa paciente era algo comum demais para uma grande qualidade. achava pequeno e sem tanto brilho, como ser alguém criativa, por exemplo.
ela passava pano no chão quando ouviu no andar de cima as duas conversando:
"- já vai fazer um ano que ela está com a gente e não vi uma melhora, não consigo ver a evolução dela."
naquele mesmo dia ela ficou três horas depois do horário. sua mente ficara vez ou outra trazendo essa frase a tona. no meio de um desses devaneios sentiu seu celular vibrando no bolso. mais de cinco ligações perdidas de sua mãe. foi no banheiro e atendeu a ligação falando baixo para elas não escutarem.
"- fala mãe"
-" minha filha, seu irmão acaba de ser internado, estamos no hospital, se você puder me ajudar com as coisas de casa, acho que vou dormir por aqui hoje..." a voz dela trêmula, entregava seu choro e seu sofrimento.
"- o que houve? ele estava bem quando eu saí pra trabalhar"
ele havia cortado os pulsos, a mãe chegara do mercado, chamou seu nome ao entrar em casa.
ele não respondeu.
olhou nos quartos.
ninguém.
abriu a porta do banheiro ele estava desmaiado no chão.
ao seu redor uma poça escura de sangue.
a mãe levou alguns segundos para capturar essa cena e voltar a realidade sobre o que estava vendo e o que devia fazer.
vidros de remédios vazios ao lado dele indicavam que também os haviam tomado.
os acontecimentos seguintes foram socorristas tentando reanimá-lo.
a maca.
o corpo dele dentro da ambulância.
a mãe segurando sua mão e repetindo a mesma oração baixinho enquanto lágrimas não paravam de escorrer pelo seu rosto.
o quarto de hospital.
os olhos dele que não se abriam.
desligou o telefone, enxugou as lágrimas, retocou a maquiagem e saiu do banheiro.
as duas já haviam descido e estavam por ali finalizando a organização para fechar o estabelecimento. viu quando uma cutucou a outra e disse:
"- eu não te falei"
passou por elas.
abriu seu melhor sorriso e terminou de atender seu último cliente, que agradeceu a ela pelo ótimo atendimento e disse que com certeza achara o lugar certo e que voltaria em breve. as duas ficaram observando meio desconfiadas, mas não disseram nada.
ela então pegou sua bolsa.
apagou as luzes.
trancou a porta.
passou o cadeado no portão e pediu a Deus para levá-la em segurança pra casa e que abençoasse a vida da mãe e do irmão.
no dia seguinte estaria ali novamente bem cedinho pela manhã.
com um sorriso no rosto, foco, dedicação
e sua maior qualidade.
paciência.