QUEM SEMEIA LÁGRIMAS NÃO COLHE SORRISOS
Algumas pessoas vão falecer sozinhas, longe dos que amam ou já amaram, sem o alento da mão amiga, dos abraços familiares, do olhar triste, pelo menos, de bichinhos de estimação. Morrerão ouvindo a própria agonia, presenciando seus últimos estertores e derradeiros suspiros. Chorarão o abandono, a distância do calor humano, as pontes que deixaram de atravessar, as vozes que não quiseram escutar e os inúmeros carinhos negados aos que os amaram outrora. Derramarão lágrimas em razão do mundo que o esqueceu, mas sobretudo por causa do desprezo, da indiferença e do desalento provocado pelos anos mentirosos dos caminhos perseguidos por seus passos atrevidos.
Mas em seus últimos momentos muitos deles saberão, mais que nunca, pois suas vidas passarão diante dos seus olhos como um filme cruelmente real, o quanto são culpados por estarem morrendo na solidão, reconhecerão serem eles mesmos os protagonistas de seus desatinos. Alguns rezarão contritos no instante final, outros farão orações de arrependimento, e haverá os que apenas se lamentarão ou gritarão impropérios desmedidos contra o que consideram injustiças da vida. Estes nunca aceitarão a mancha da culpa pesando sobre eles em razão de suas prováveis más escolhas, atos e atitudes.
Eles estarão colhendo, em seus minutos terminais, o fruto das sementes semeadas ao longo do tempo, nem lembrarão todos como elas foram plantadas aos risos e ironias no chão farto da impiedade, talvez imaginando que o tempo de colher às lágrimas o que plantaram sorrindo jamais chegaria. E isso, na verdade, não passava de lado engano. Semear é opcional, mas colher os horrores ou as boas obras do ontem é inevitável no amanhã, impossível escapar dessas consequências, benéficas ou maléficas. E morrer deitado sobre a solidão deriva dos lamentos, das tristezas, dos choros, do desprezo, da indiferença e da sordidez outrora plantados na grande seara dos anos idos.