NO LIMBO ("Aquilo que não é consequência de uma escolha não pode ser considerado nem mérito nem fracasso" — Milan Kudera)
Era uma noite sombria, mal peguei no sono já estava envolta em mistérios e inquietações. Encontrei-me perdido em meio a visões turbulentas, navegando pelas profundezas da minha própria existência. O livre-arbítrio, uma dádiva divina, ressoava em minha mente como um eco incessante, despertando questionamentos profundos. Afinal, se possuía o poder de construir meu próprio futuro, como um Deus em minha própria realidade, por que então parecia que Lúcifer triunfava repetidamente sobre minhas questões?
Nessa terra, outrora repleta de promessas e possibilidades, minha dignidade parecia desvanecer-se como uma chama ao vento. Pois, ao contemplar aqueles que eram agraciados com a entrada no céu, percebia que não era por mérito próprio que alcançavam essa glória. Eram os méritos de Jesus que os conduziam às alturas celestiais. Diante disso, rejeitei a ideia de trilhar esse caminho e decidi permanecer na terra, em um estado de indigência moral, carregando a consciência de que não era digno dessa graça.
Contudo, o inferno também não me atraía, pois adentraria seus abismos pela força dos meus próprios méritos. Seria uma justiça amarga, é verdade, mas também reconfortante, sabendo que eu teria merecido aquela punição eterna. Foi então que me vi em um impasse existencial. Viver pela graça e através da graça seria abusar dos méritos alheios? Ou talvez, fosse melhor acreditar no livre-arbítrio e construir meu próprio paraíso, até mesmo convidando Satanás para partilhar do meu lar, privando-o de sua própria dignidade. Não seria pelos meus méritos, nem pela ausência deles, mas sim o fim seria o nada que precede a própria existência.
E assim, mergulhado nesse mar de questionamentos, acordei. Agora, desperto sei que a busca frenética por títulos divinos e poderes inalcançáveis é um labirinto sem saída. O verdadeiro sentido da vida não reside na tentativa vã de se equiparar a Deus (livre-arbítrio), mas sim na jornada interior em busca da nossa própria essência.
Convido cada um de vocês, leitores, a viver, não há escolhas. Em um mundo cheio de incertezas, encontrem coragem para serem autênticos, para abraçarem sua singularidade e caminharem em direção à predestinada plenitude . Pois, no fim das contas, a verdadeira dignidade não é encontrada nos méritos que acumulamos ou nos títulos que ostentamos, mas sim na honestidade consigo mesmo.
Assim, continuamos escravos das ambições vazias e da busca incessante por poder. Pois, já encontramos a grandeza na simplicidade de sermos quem somos, trilhando nosso próprio caminho a nós oferecido pela a integridade e o amor dos deuses. Que possamos aprender a valorizar a jornada, sabendo que o fim, afinal, é apenas o eco do vazio que antecede a nossa existência. CiFA