à meu pai
Despertar novamente
O homem abre os olhos em um lugar completamente desconhecido e razoavelmente movimentado com várias pessoas de rostos familiares. Um lugar pacífico e silencioso onde as folhas das árvores dançam de acordo com vento suave e as pétalas traçam seu caminho lentamente em zigue-zague, tranquilamente sem se importar para onde vão, pois sabem que este lugar é bom. Este é o lugar para tudo que é bom.
As memórias do homem sobre seus últimos dias são vagas, lembra-se de vários outros rostos não tão sorridentes em um lugar não tão bom. Lembra-se de estranhos barulhos e sono. Muito sono. Dessa vez, entretanto, sente-se completamente desperto e como se possuísse dezoito anos novamente, época na qual servia exército e levava alguns tapas de sua mãe por se atrasar para o ônibus. E este é o primeiro rosto que reconhece, olhando-o com ternura nos olhos e no grande sorriso estampado nos lábios.
“Bem vindo, meu filho”, ela diz, com uma voz que ele não ouvia há muitos anos e, até o momento, não sabia o quanto sentia falta.
“Mãe?” O homem pergunta ainda mais confuso.
“Sim”, ela responde carinhosamente. “Estávamos todos à sua espera”.
“Bença, mãe”, ele diz naturalmente, mas ao mesmo tempo começa a se preocupar. Algumas memórias começam a surgir de forma inesperada: uma esposa, filhos, uma família. Onde estão? Será que não os viu ao abrir os olhos naquele novo lugar?
“Deus o abençoe”, ela responde percebendo a preocupação do filho. Calma e carinhosamente ela responde: “Eles não se encontram conosco, por enquanto.”
“Mas não posso deixá-los, mãe. Eles precisam de mim, tínhamos tantos planos juntos! Não posso abandoná-los em um momento tão importante!”
Vendo sua agitação a mulher coloca a mão no ombro de seu filho e diz:
“Eles ficarão bem, Zé. Sua família entende que agora é seu momento de paz, de reencontrar aqueles que partiram e conversar tudo que não puderam antes. Você tem toda a admiração deles, pois sabem que se existiu um homem que lutou e venceu é você. Sabem que você nunca se prendeu a coisas pequenas da vida, nunca deixou rancor ou raiva envenenarem sua alma. Não somente isso, mas utilizou amor, carinho, atenção e apoio para aumentar ainda mais a luz no seu coração. E essa luz nunca desaparecerá, ela é sua herança para o mundo e principalmente para aqueles que tiveram o prazer de conhecê-lo. Poucos podem dizer que fizeram o mesmo.
“Por isso deite-se tranquilo na grama, aproveite a luz do sol, sinta a brisa em seus cabelos e sorria em paz sabendo que a Leonor, a Larissa e o Fernando continuarão suas caminhadas tentando seguir seus passos, tendo sua imagem na mente e principalmente tentando reproduzir um pouco dessa luz que você deixou para trás”.