AINDA É UMA ROSA
Envelhecer é assim: transformar a beleza anterior em novas belezas, provocando outras formas de ver e ser visto. A rosa prestes a cair no chão do jardim ainda guarda um pouco de seu perfume, diferente do perfume de antes, mas ainda perfume. Ainda tem a essência da rosa, nascida com uma finalidade no ciclo da vida, e finalidade alcançada, tipo missão cumprida. Suas pétalas envelhecidas ainda podem ser guardadas com carinho entre folhas de um caderno, ou virar adubo no mesmo jardim onde nasceu e cresceu. Tudo tem seu tempo e seu espaço de vivência e sobrevivência.
Neste fim de semana de feriado estou a cuidar de minha mãe, bem velha. Ela perdeu sua vitalidade, sua memória e sua audição. De vez em quando eu a pego na cozinha mexendo nas panelas. Como não tem mais a agilidade da cozinheira que foi um dia, não a deixo trabalhar no fogão. Ela esquece chamas acesas, torneiras abertas e pode se queimar pela falta de força nas mãos para pegar peso. Sua vontade é de fazer algumas das coisas que sempre fez, como quando eu chegava em sua casa e ela ia fazer sua famosa receita de pão de queijo com o cuidado maternal. Como não dá conta fica ansiosa, sem lugar dentro de casa.
Isso me remeteu a outra questão que pode ser importante no caso. Não tenho a resposta, mas a pergunta começou a me perturbar hoje: será que se ela tivesse hobbies seria diferente? Será que se tomasse seu tempo para fazer coisas manuais, tipo tricô e crochê, ela seria menos ansiosa? As coisas que ela gostava de fazer eram conversar, sair de casa e representar no palco. Todas essas atividades ficaram prejudicadas com a idade, a paralização pela pandemia, a perda de memória e a surdez. Principalmente pela pandemia. Ficar dois anos em casa sem ter o que fazer foi terrível para ela.
Agora, pensando em meu próprio processo de envelhecimento, o que devo fazer para não acontecer o mesmo comigo? Que hobbies deveria ter para envelhecer fazendo, mesmo que a memória e outras acuidades físicas e mentais se deteriorem? Algo que eu lembre como coisa antiga quando a memória falhar. O que eu sei fazer bem hoje e que poderei continuar fazendo quando não mais conseguir fazer outras coisas? Hora de pensar em uma lista e me aperfeiçoar nas técnicas necessárias para executá-las bem. Ou quem sabe aprender atividades novas.
O que gosto de fazer e sei fazer bem, hoje, são: ler e escrever, dar minhas palestras (embora pense que as pessoas não têm paciência para escutar os velhos), cuidar de horta e jardim, fotografar e filmar (esses quesitos me dão prazer, mas preciso me aperfeiçoar), escrever cartas para os amigos, principalmente essas. Minha companheira insiste que eu aprenda a cantar e tocar um instrumento. Talvez seja essa uma saída interessante para amadurecer: aprender música. E fazer atividades físicas, claro. Sempre fui atleta amador, mais que nunca é hora de continuar. Será que me antecipei ao problema e o resolvi? O tempo dirá.