Óleo de Fígado de Bacalhau ⚫️
A embalagem era medonha, o nome repugnante, o rótulo apavorante, a aparência do conteúdo péssima e o sabor horrível. O conjunto espantava qualquer um, mas diziam que, paradoxalmente, fazia bem. A vitamina vinha disfarçada com o eufemismo ininteligível de Emulsão Scott, mas a máscara desabava após uma observação mais detalhada. O rótulo exibia uma imensa e animadora relação de vitaminas, que não resistia ao asqueroso e pior nome que uma vitamina possuiu: Óleo de Fígado de Bacalhau. Para piorar — que sempre é possível piorar as coisas — o tônico trazia (e ainda traz) a estampa de um senhor arrastando um imenso peixe nas costas. O sofrimento chega ao paroxismo quando o líquido é ingerido. De sabor horrível e viscosidade nojenta, o negócio é difícil de ingerir, a imagem do bacalhau abatido torna a tarefa quase impossível. Eu engolia isso como um ganso de “foie gras”.
Hoje, apesar do péssimo nome e da figura exibida, o fortificante oferece os deliciosos sabores laranja e morango. Melhor assim...
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Não bastasse ralar a perna, arrancar a tampa do dedão ou abrir a cabeça, o pior ainda estava por chegar. A continuidade da tortura tinha um nome: Merthiolate. Hoje, pode não parecer mais assustador que uma Benzetacil, mas o temido Mertiolate, que é um remédio, ardia mais que uma fratura exposta.
Depois da Segunda Guerra Mundial, geração após geração herda um mundo mais confortável: sem grandes confrontos, com facilidade tecnológicas, grande oferta de alimentos e sem Óleo de (argh) Fìgado de Bacalhau sem sabor e Mertiolate que arde. Realmente, o mundo ficou muito melhor.
Voltando mais, na Primeira Guerra Mundial: qualquer cidadão de classe média de hoje vive mais e melhor que um magnata há 100 anos. Dúvida? De novo, recorro a qualquer inovação tecnológica. O acesso ao celular e suas funções já encerra alguma ameaça de debate. E o Óleo de Fígado de Bacalhau e o Mertiolate? Se já existiam, eram bem piores. E a medicina devia ser bem amedrontadora.