Atestado de Óbito

Quando se morre alguém próximo, lidar com o luto é só uma das partes do processo.

O funeral, por exemplo, alguém tem que fazer. Funeral bom é funeral dos outros. Você entra, dá os pêsames, come uma bolachinha, toma um café, larga algumas lágrimas ou muitas, e ainda dá umas risadas. Tem que ter algo engraçado ou não é enterro.

Mas quando é você que tem que fazer, aí é outra história. Mal caiu a ficha do falecimento e existe mil coisas a resolver. Por sorte meu irmão fez muitas, para mim piores, atestado, buscar os objetos no hospital e voltar para a casa vazia.

O funeral é assim, você tem senta com um cerimonialista. Nunca imaginei que existisse este personagem fora de casamentos ou festas de 15 anos. Mas tem.

Em fração de horas, temos que encontrar fotos, músicas, textos, homenagens, chamar gente, consolar gente e assim por diante. E sóbria!

Para que os presentes fiquem tocados, mas não sofram de depressão, o final tem que ser pra cima. Algo alegre para que a plateia possa rir um pouco.

Acho que foi um evento bonito e leve. Acho ..porque não fui. E meu pai entenderia. Detesto essas despedidas.

Depois disso a gente pensa que deu, que agora podemos seguir em frente e elaborar. Mas não.

Tem inventário, contas, burocracia que não acaba mais.

Hoje fui resolver mais uma pendência num banco. Algo que achei já estar resolvido há meses.

Entrei na agência o segurança me perguntou o que desejava e ao saber que era sobre o Atestado de óbito, queria saber quem era e se compadeceu. Diz que lembra do meu pai. E seus olhos se encheram de lágrimas contando que seu pai também tinha partido no mesmo mês que o meu, e mesmo motivo.

Fila, espera, entra, senta..aguarda. E fui parar perto de uma senhora animada querendo puxar assunto. Ao me perguntar o porquê de eu estar ali, não sabia o que fazer com a informação. Ficou sem graça, tadinha.

Senta, levanta, sou chamada. Mais tempo, mais papéis, senhas e coisas quase resolvidas.

Me despeço, agradeço a gentileza de todos. E vou saindo pela porta de vidro, quando o segurança me chama.

" Força.!"

Com os olhos cheios de lágrimas e com a mão pousada no meu ombro. Carinho, troca, juntos na mesma pandemia, despedidas, afeto.

Devolvi, força para você também!

E seguimos com o nosso dia, cheio de sol e vida lá fora e aqui dentro também.

Juli Sell
Enviado por Juli Sell em 17/04/2022
Código do texto: T7497122
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