Pavilhão das Almas
O local é antigo (foi construído há mais de um século) e é mantido fechado há pouco mais de cinco décadas. Suas dimensões assustam: 700 m². Dizem que há mobílias de época nele; outros negam isso: afirmam que há, de facto, apenas um imenso vazio que preenche o lugar, numa relação de proteção interna versus ação externa do tempo. A meu ver, é como um enorme coração parado, feito com cimento e ferro. A comparação me parece adequada: há almas lá dentro. Sentimentos presos. Ele fora fechado antes da primeira grande guerra. Reitero: há almas lá dentro – mas não posso explicar isso com poucas palavras. É uma questão complexa. Atingir seu fulcro é deveras complicado, difícil. Nos parágrafos, que seguem, contudo, eu tentarei fazê-lo.
Quem se aproxima do local relata sentir uma discreta emanação de uma espécie de energia densa, gélida, penetrante – uma força realmente estranha.
Ela me interrompe:
– Tá. E como VOCÊ descreve essa "força realmente estranha"? De modo mais objetivo.
– Eu? Como eu disse, ouvi relatos de outras pessoas. Ora, eu, no máximo, posso dar meu parecer bastante indireto sobre esse fenômeno. Minha primeira hipótese é a de que a) as pessoas já carregam consigo uma impressão do local, com base no que ouviram de outras pessoas. E isso acaba por influenciá-las. Essa influência é cientificamente explicável. É algo psicológico, nada de sobrenatural nisso. Minha segunda hipótese é que b) a aparência do local, o fato de estar trancado há mais de meio século e seu tamanho enorme sugestiona as pessoas, ainda que elas não saibam qual o seu papel histórico do edifício. Bem, entre ambas hipóteses há correlação. Eu sinceramente não vejo mais nada que possa dar explicação plausível sobre o lugar trancafiado há tanto tempo.
Ela presta total atenção ao que eu digo. Mantém-se calada. Olha-me nos olhos, como quem buscasse um segredo antigo guardado a sete chaves. Eu compartilho do comportamento com ela. Isso sim é que é uma sensação estranhíssima – quem já tentou fazê-lo nunca passou de alguns segundos. Ninguém (que eu conheça) consegue olhar outra pessoa nos olhos, como quem quer dar um mergulho n'alma da outra pessoa por mais que alguns instantes – que parecem eternos.
– Mas voltemos ao lugar. Digo, à questão do lugar – retomo nosso diálogo – Você conhece o Pavilhão?
– Meu bisavô chegou a passar por ele. O lugar nunca trouxe boas recordações a ninguém. Ele (o Pavilhão) – é interrompida pela telefone fixo; para e vai atendê-lo. "Luiza", diz a pessoa do outro lado da linha, ligaram da escola. A professora não virá hoje. As aulas voltarão somente na segunda-feira que vem. Daqui quatro dias.
Luiza volta e segura minhas duas mãos. Pede que eu a acompanhe hoje à tarde. A gente irá até o Pavilhão. Para tirar algumas fotos...
(Continua...)