A CASA DE NECESSIDADES

O sol raiava pleno há algumas horas. O cotidiano na cidade, como em qualquer outra, dento da normalidade. As pessoas acordavam cedo como a sobrevivência humana exige com a certeza de o pão na mesa ser uma batalha diária.

Para Tarcísio, não. De segunda a domingo, os dias eram todos iguais.

Tarcísio levantou preguiçosamente da cama, pela janela viu o vai e vem das pessoas pelas ruas e olhando para o sol, reclamou da alta temperatura. Na cozinha, o café da manhã carinhosamente posto sobre a mesa. Tudo frio, mas não se sentia com disposição para esquentar nada. Ele não tinha o hábito de fazer esforços com coisas desnecessárias, quente ou frio, para ele não tinha importância alguma.

Gervina levantava sempre antes do sol. Lecionava os dois horários do dia e eram muitos os afazeres domésticos, além do mais, Tarcísio não sabia fritar um ovo. Assim, antes de sair para o trabalho, tinha que deixar a casa limpa e arrumada, o café da manhã pronto e o almoço encaminhado para quando chegar em casa ao meio dia, dar apenas o ponto final. Ela nunca reclamava de sua correria e até se definia como uma das mulheres e Atenas.

Tarcísio, seu príncipe encantado, foi um presente de Deus. Afirmava ela. Tinha o mesmo nome de seu santo de devoção, São Tarcísio. E fazia aniversário justamente na data em que se comemora o dia de São Tarcísio, 15 de agosto.

Não tinham filhos. Sempre que tocava no assunto, Tarcísio há mais de dez anos argumentava a mesma coisa, era preciso esperar mais, se organizarem melhor. Gervina lhe dava plena razão em pensar assim, afinal a vida não estava nada fácil. Moravam numa cidade de médio porte e Gervina tinha o costume de único trajeto: escola, casa, igreja. Ida e volta. Raramente ia ao banco, Tarcísio quem cuidava das finanças da família.

Gervina evitava rodas de conversas. Algumas pessoas aproveitavam a presença dela e faziam comentários sobre Tarcísio. Ela não admitia isso, o que importava era sua verdade. Tudo inveja! Sentenciou Gervina.

Tarcísio não tinha emprego fixo. Se apresentava sempre vestido com elegância, uma fala mansa e palavras bem colocadas. Não costumava dormir cedo, motivo de na maioria das noites chegar tarde em casa. Para Gervina, dizia que estava batendo papo com os amigos ou fazendo visitas a familiares. Tarcísio é um homem de bons modos. Acreditava ela.

O dia amanheceu e Gervina com uma expressão enfadonha. Não conseguia dormir antes de Tarcísio chegar em casa e coincidentemente, quando ele sabia que iria demorar, esquecia de levar o telefone com ele.

Gervina decidi sair à sua procura. Não fazia ideia do que aconteceu e Tarcísio poderia estar precisando dela. Quando encontrava algum conhecido indagava por Tarcísio. Alguns diziam não saber informar, outros até sabiam, mas evitavam dizer. Até que encontrou alguém mais próximo e conhecia a vida do casal e disse que ele se encontrava na casa de necessidades e informou como ela chegaria lá. Gervina seguiu mais tranquila, pelo nome do local, Tarcísio passou a noite em trabalho voluntário.

Gervina se deparou com um letreiro luminoso em letras garrafais: A CASA DE NECESSIDADES. E apesar do dia claro, as luzes vermelhas continuavam acessas. Foi um choque de realidade, jamais imaginou seu marido naquele ambiente, não era lugar para ele. Decidida, entrou na casa.

Sentado numa mesa com várias garrafas de bebidas vazias estava Tarcísio com Nalva sentada no seu colo. Gervina ficou paralisada com a cena e por alguns segundos ficou procurando na memória pelo seu curtíssimo repertório de palavrões e escolheu o de maior agravo e quase gritando foi na direção de Nalva:

─ Atrevida! Com se atreve a sentar no colo do meu Tarcísio. E vendo o estado de embriaguez do esposo, emedou: Aproveitadora.

Nalva com a experiência de vida que a profissão por mais de uma década lhe proporcionara e ter passado por situações semelhantes várias vezes, levantou-se calmamente e foi para o seu quarto de trabalho. Tarcísio levantou cambaleante e esbarrando na mesa derrubou algumas garrafas. Confuso com a chegada surpresa da esposa e consciente que por sua causa, a mulher que amava de verdade, que lhe faz passar noites em claro, apaixonado. Agora estava ela ali passado por um momento tão constrangedor. Segurou a mão de Gervina e seguiram para a saída da casa. Antes de sair, Tarcísio deu uma última olhada na direção de Nalva. Ela em pé na porta de seu quarto e pela expressão de seu rosto, estava realmente se sentindo constrangida.

Henrique Rodrigues Inhuma PI
Enviado por Henrique Rodrigues Inhuma PI em 13/04/2022
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