TARDE DE DOMINGO
Hoje fiz as tarefas de casa com calma, com o vagar de quem tenta segurar o tempo.
Estava só, como sempre estive, mas, desta vez, a sozinhez não me doía. Pelo contrário, era uma unção, pois me permitia controlar o movimento do ponteiro do relógio a tiquetaquear na parede da sala.
É domingo e, passado das treze horas, recém comecei a descascar as batatas para a salada e a desvestir o pijama suado do pesadelo tantas vezes repetido nas madrugadas.
Será longa a tarde! Hoje não tem Grenal...
A casa vazia projeta diálogos improváveis e me faltam os amigos que a pandemia me roubou. Mais ainda me faltas tu. Te imagino no "laptop", mergulhada no mundo que nunca dividimos. Sempre pensei que por ali fugias de dores guardadas em segredo para não contaminar nossa relação. Ainda continuo, nestas tardes de domingo, um incompetente "adivinhador".
As dores que guardavas permanecem inadivinháveis. Apenas as tardes de domingo competem com os teus segredos na busca de um afeto possível, de um repouso emocional, de uma perspectiva de sonhos minimamente plausíveis.
Nessas tardes de domingo deveria entender o quanto fomos incompatíveis, mas o máximo que aprendi é que batatas cortadas cozinham em dez minutos.