O ENCONTRO

(Alberto Vasconcelos)

Depois de atender ao telefone, Lenira (L) falou à irmã absorta no jogo eletrônico do tablet novo.

- Candinha (C), Isaura disse que vem nos apanhar as três da tarde.

(C) - Hum? O quê?

(L) - Isaura vem nos buscar as três da tarde.

(C) - Que Isaura? Quem é Isaura?

(L) - Candinha do céu! Não comece outra vez. Você sabe muito bem quem é Isaura.

(C) - E para que é que ela vem me buscar? Eu não quero ir para canto nenhum. Quero ficar jogando meu jogo novo.

(L) - Você pode até nem querer ir, mas vai. Eu não estou doida para deixar você só em casa. Vista seu vestido de brocado para não parecer mendiga no meio de estranhos. Se seu mal-estar é por causa deste tablet novo, pode levar, porque não vai fazer nenhuma diferença.

(C) - Eu não quero ir para lugar nenhum. Essa mania que você tem de encher as ruas de pernas... se pelo menos tivesse pernas grossas, mas esses palitos de japonês que você chama de pernas, faz até vergonha. A meia fica frouxa na batata da perna balançando quando você anda.

(L) - Nós vamos para o clube. Não vamos encher as ruas de pernas, sua linguaruda. E as minhas pernas são tão finas quanto as suas e estão me servindo muito bem há mais de setenta anos. Vá tomar banho. Não pense que me engana com aquele tempo todo que levou ontem com o chuveiro ligado. Eu ouvi a água batendo diretamente no tapete de borracha e as suas costas estavam enxutas quando você, finalmente, saiu do banheiro.

(C) - Eu não me esfreguei no chão de ontem para hoje. Ainda estou limpa e só vou tomar banho antes de ir dormir depois que voltar.

(L) - Não senhora. Vai tomar banho antes de ir e depois que voltar, velha fedorenta.

(C) - Fedorenta é você ou a sua mãe.

(L) - Nossa mãe, melhor dizendo, era uma mulher limpa e cheirosa. Não era como você que tem medo de banho como Cascão da turma da Mônica.

(C) - E o que é que a gente vai fazer não sei aonde?

(L) – Vai começar a se fazer de doida outra vez? Essa sua demência é safadeza e comigo não cola.

(Aristeu Fatal)

À hora marcada, Isaura (I) buzina em frente ao prédio onde as irmãs moram. Em cinco minutos Lenira e Candinha desceram, esta de banho tomado e vestida como a irmã lhe pedira.

(L) – Boa tarde Isaura!

Candinha entra no carro pela porta traseira, furiosa como sempre, sem abrir a boca.

Isaura responde, e, claro, nota os modos grosseiros de Candinha. Lenira ao lado da amiga, dá uma olhada de lado, faz um gesto com a boca, como que dizendo, não liga, hoje ela está naqueles dias.

(I)- Já percebi, não ligo. Vamos ver se hoje nos temos mais sorte com as cartas, e ganhamos a partida muito importante, pois, se perdermos seremos desclassificadas do torneio.

As duas participavam do campeonato de tranca do clube, o Tênis Club da cidade. Enquanto traçavam estratégias para o jogo, Candinha não largava o tablet, entretida na sua partida.

O clube ficava fora da cidade, a meia hora de distância, de modos que as conversas serviram para distrair as amigas, e o ambiente seguiu normal, até chegarem no destino. Isaura achou um bom lugar no estacionamento, e logo Candinha desceu e se dirigiu em sentido completamente diferente das outras, mais para o lado do bosque que ali existia.

(I)- Lenira, já conversamos diversas vezes sobre sua irmã, porém, não estava na hora dela procurar uma psicóloga ou psiquiatra, a fim de se verificar e tentar resolver o seu problema? Talvez, até seria fácil a solução, com uma simples regressão de sua vida, encontrasse o motivo desses altos e baixos no comportamento dela. Ou, até um medicamento...sei lá. Ela teve algum caso de amor que não deu certo, alguma desilusão?

(L)- Olha, Isaura, a Candinha a vida toda foi esquisita, fechada, de poucas amigas. Minha mãe sempre procurou saber o que se passava com ela, procurou muitas vezes levá-la a uma psicóloga, mas as reações de minha irmã eram muito violentas, e como Candinha não era má aluna, mamãe não se via com força para maiores pressões. Agora, a questão de desilusão amorosa, não tenho conhecimento. Todavia, desconfio que ela possui um diário, pois em certas ocasiões, mais que uma vez, ela tentou esconder de mim, algo que parecia estar escrevendo. Quem sabe?

O horário, quatro da tarde, para início do jogo de tranca das duas, estava para chegar, então elas seguiram para o salão de carteado do clube.

(Cléa Magnani)

O jogo estava animado. Lenira, tão preocupada em deixar a irmã sozinha em casa, agora nem notava a ausência de Candinha. Uma rodada após outra, e não viam o tempo passar.

Terminado o carteado, resolveram tomar um lanche, e foi então que Lenira percebeu que Candinha não se encontrava no salão.

Isaura a despreocupou dizendo que ela deveria estar no jardim ou ter ido ao banheiro, e que logo depois do chá elas a encontrariam.

Um tanto renitente, mas convencida pela amiga, Lenira se reuniu ao grupo e foram ao salão de chá onde a conversa e risadas se misturavam ao tilintar das xícaras, e a conversa ia longe.

A tarde caía e Candinha não aparecia. As amigas já se retiravam e Lenira já passava da preocupação para a aflição. Onde estaria sua irmã?

Saiu com Isaura procurando pelos departamentos do clube. Perguntou para conhecidos e para os funcionários que conheciam todos os associados, e nada. Um dos que cuidava dos jardins disse havê-la visto no bosque. Mas já fazia muito tempo.

Lenira pediu que Isaura a esperasse ali na saída enquanto ela iria até o bosque procurar junto com o jardineiro. E também nada encontraram.

Desesperada, Pediu ajuda na portaria e todos passara a procurar Candinha. A noite chegou. E quando já se preparava para avisar a polícia, Candinha apareceu acompanhada por um senhor muito distinto. Vinham conversando animadamente e ela o apresentou à irmã:

(C)- Este é o Dr. Ariovaldo Miranda de Menezes. Nos conhecemos através de um site de encontros, já há algum tempo, pela internet. Sempre conversamos, mas nunca nos havíamos visto pessoalmente. E hoje quando você me avisou que viríamos ao clube, combinamos em nos encontrar aqui para nos conhecermos ao vivo.

(A)- Muito prazer senhora Lenira! Sua irmã me fala muito da senhora. Gostaria de convidá-las, e à sua amiga também – disse se dirigindo a Isaura – para jantarmos no restaurante de meu irmão que fica aqui perto, assim poderemos nos conhecer melhor e marcarmos outros encontros, que tenho certeza, serão muito agradáveis.

E dirigindo-se à Candinha, passando o braço pelo seu ombro. - Não é meu bem? -

Isaura e Lenira se entreolharam estupefatas... E todos caíram na gargalhada...