Da Cor de Rosa

“A SEGUNDA CADEIRA DA JANELA É MINHA, MATEUS!" – Gritou desesperadamente Aninha.

Em meio aquela euforia e discussão toda de quem senta ou não senta próximo a janela, eu já com meus trinta e tantos anos, me senti presa no looping da adolescência. Suspirei profundamente, não porque estava odiando ver aquela cena toda, eu sorri, porque um dia já fui assim. Agia feito boba, brigando por coisas simples e por muitas vezes insignificantes. Os dois com raiva, se separaram e não conversaram mais durante a viagem, silenciaram-se e cada qual no seu canto jactava sua raiva. Pareciam até "velhos carrancudos.”

Os ossos do ofício me fazem estar “presa” constantemente com aqueles que ainda estão construindo suas próprias percepções e descobrindo a vida. É interessante como a maturidade vem devagar, e sem perceber ela vai nos moldando e nos tornando de fato quem nascemos para ser. Mas até ela chegar por completo…

Seguimos no cortejo do silêncio rumo ao nosso destino. Meus olhos vagando longe detectaram no horizonte a beleza da paisagem nordestina, que com a chegada do período chuvoso, vestiu-se de verde para comemorar o período mais aguardado. Em meio ao vicejante que saltava ao meu olhar, ludibriei a esplendorosa cor reluzente que me impactou mais do que o verde que outrora me prendia.

Da cor de Rosa, meio revoltosa, estava a árvore Ipê iluminando o cenário verde com sua irreverência. O rosa lembrou-me da revoltosa menina de cabelos rosa que vi por duas vezes parada no sinal, nos avistamos apenas duas vezes e conversamos intensamente apenas com olhar, o amor surge assim, meio sem querer. Nunca ouvi seu timbre de voz, nem ela o meu, entretanto, nas duas conversas acompanhadas pela centelha de nossa vida, compartilhamos o que muitas vezes nunca é compartilhado numa conversa “normal.” Da última vez que nos vimos, percebemos que não éramos mais as mesmas, tínhamos mudado completamente. Não sei o nome verdadeiro, carinhosamente a chamo de Rosa. O Ipê que bagunçava o verde, não era cor-de-rosa, era da cor de Rosa e se assemelhava a ela em igual audácia.

Os cheiros, gostos e pessoas deixam marcas, algumas positivas outras negativas e ainda há aquelas que nem marcas deixam, desaparecem feito vento na estrada que é a nossa vida.

Ao retornar meu olhar para os meninos que brigavam pela cadeira próxima a janela, surpreendi-me. Ambos estavam rindo sabe-se lá Deus de que, percebi que assim é o 'nascimento' do amor. Também sorri, que bom é estar "presa'' no looping da adolescência, com eles posso aprender mais sobre o que é verdadeiramente o amor.

Daniele Pereira
Enviado por Daniele Pereira em 13/03/2022
Reeditado em 13/03/2022
Código do texto: T7471790
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