PARA VERA PASTRANO E MARIA ALICE TOLEDO. ARTE; SUAS LINHAS.
Cultura, comunicação entre as eras no trânsito das sensibilidades humanas; caminhada da arte. Prevalece a personalidade humana, a janela da alma aberta à máxima manifestação humana. Reserva de poucos.
Muitos cortam o ligame que os une à humanidade por esse veículo, violentados pela guerra como agora se vê.
No Brasil, teatro tímido em suas realidades de palco vivo, mostrou força nas novelas no cenário artístico projetado na Europa, nesse longo braço de cultura brasileira, devido às novelas. Nada projetou mais para massas o Brasil do que o teatro nessa versão cultural. Me lembro quando na Europa, já finda à época a novela “Roque Santeiro”, anos 80, com Regina Duarte, motorista de táxi vendo que falávamos em português, eu e minha mulher, perguntou se conhecíamos a novela e como seria o fim, já que estava no meio em seu país. Disse que o desfecho perderia a graça, mas quis saber, e foi por nós contado.
Tive contato com artistas de novelas, principalmente os ditos globais, TV Globo, emissora tão criticada. Isso em palestras que fiz, convocado por acadêmicos, no Ministério da Educação sobre direitos autorais. E justamente nesse ponto, direitos sobre novelas vendidas para o exterior, discorri e esclareci. Fui indagado largamente sobre a participação; defini direitos então.
Devemos muito, a cultura brasileira deve, a essa projeção no mundo de nossas artes cênicas aos artistas de novelas e à TV Globo. Se nosso teatro é frágil, essa vertente de teatro é fortíssima.
Por força de direito reservado, pouco foi e é destinado ou nada para as atrizes e atores na mercancia desses direitos. Resulta da contratação, ou nasce da própria lei não havendo ressalvas. O artista nada recebe pelo contrato que a lei regula. O produto é do contratante. Questão “inter partes” quando da convenção contratual, sempre impositivo assistência de advogado especializado.
“Tudo vale a pena se a alma não é pequena”; Fernando Pessoa.
Na arte brasileira a alma tem sido mais que pequena. As fraudes e os números mostraram que a Lei Rouanet foi paraninfa do despropósito em favor pessoal.
Escândalos multiplicados abertas as gavetas do desvio afloraram. Está no domínio público. Coloquem na internet, Fraude, “Lei Rouanet”, e verão o alcance. Um dos muitos verbetes:
“MPF oferece 27 denúncias à Justiça Federal de SP por fraudes na Lei Rouanet”.
Não somos nada como aprendi e ressalto, além da alma que se funde no cosmos da procura e se pacifica. O planeta Terra é grão no universo, e nós o que somos? Alguns chama de sabedoria na humildade e no silêncio, ao menos para si no descortino do mundo que frequentam, e principalmente na utilidade que doam, profissional, sem correrias, ainda que destacados socialmente, o que as vezes incomoda de forma difusa, pois obstruem entraves para o desvio. Utilidade que se não exercida, faz involuir no caminho existencial, que se apaga e esvazia em interior de sombras.
A arte repara arestas, aproxima, enobrece, enriquece o espírito, a cultura referencial na passagem das eras. Ponte dos tempos na conversa da sensibilidade. Muda o homem, tenta calar a inveja, sempre resistente, mitiga a dor. É a única forma de linguagem grafada, pintada, esculpida, musicada, que pode ligar gerações, eras, épocas, a mostrar e demonstrar a humanidade e o que seja seu ser mais excelente, o homem. Tem sido assim. Quem sabe a arte ligará planetas?
É plena de verdade sob todos os enfoques a crítica. Não conseguimos visibilizar arte em crianças impúberes tocando partes íntimas de pessoas em nudez. Exercício da insensatez e da ofensa que vimos recentemente.
No barroco, que saiu da estática, superando a ausência de movimento do clássico, como em Bernini em seu David, na Galeria Borhese em Roma, não há partes íntimas desnudas agressivamente, como no David de Michelangelo, famoso, estando exposto para o mundo na Galeria da Academia em Florença. Ambos extasiam. A nudez do David de Michelangelo como de muitas outras estatuárias não chocam, o que aqui se fez agride a infância inocente.
Exibem-se os exibidos através da ruptura que desrespeita a evolução da natureza. Não existe naturalidade no que não é natural.
Temos muito a aprender com nosso interior, todos nós, não com os outros. Ninguém tem nada a ensinar de valores intransferíveis sacralizados na natureza, ao invés do subjetivo. Nisso sim, subjetividade, ninguém tem nada a nos ensinar em princípio e temos muito a aprender com nós mesmos. Todos nós.
A cultura no Brasil calcada em valores do Estado terá dias melhores, estou certo. Não se pavimenta a arte do futuro esmagando a naturalidade e muito menos desrespeitando a inocência do ser mais caro, a criança. Precisamos defender a naturalidade e a inocência caminhante, que devem estar ligadas no empirismo puro e simples, sem interferências danosas.
Nada afastará o futuro do encontro da arte com a suficiência da curiosidade célere e rica que andeja o mundo para ter intimidade com a estatuária, com as múltiplas escolas e suas faturas da pintura, pontilhismo, as sombras e a luz de Vermeer, Caravaggio, como nasceu a abstração em oposição ao figurado e ao impressionismo e esse mundo vasto que não pode enriquecer embrutecidos.
Uma das personalidades mais fascinantes da excelência humana, a arte, encarnou o conflito das convenções sociais; CARAVAGGIO, século XVI.
Exceção que alinhou temperamento forte com fama de expressar um traço vibrante e dramático, sombra e luz, claro-escuro, na busca de alcançar a verdade da beleza ideal. Mostrou a violência que tinha em seu interior, tendo a luz que o consagrou prevalecido no tempo. Sua guerra foi vencida.
É essa guerra que devemos sempre enfrentar, a guerra do mal, das trevas dos sentimentos.