Quando ser apenas Amável não é suficiente!

Meu nome é Filemon, nome grego que significa "Amável ou Amoroso".

Sou residente e natural de Colossos, cidade da Frígia, localizada a 150km de Éfeso, e importante centro da rota comercial que liga a Ásia Menor à Europa entrando pelo Mar Egeu com vistas ao abastecimento das demais cidades importantes para o Império Romano localizadas na Mísia e na Macedônia conquistadas ao Império Grego e anexadas a Roma.

Com esta descrição que faço, não é difícil compreender a miscigenação étnica, linguística, cultural e religiosa da população poliglota de Colossos que tornou a convivência das etnias locais um grande desafio sócio-antropológico para romanos, gregos, judeus e povos nativos da Frígia

Durante os anos 46 a 48 d.C, recebemos forte influência do Cristianismo que chegara à Pisídia por meio da ação missionária de um certo judeu com dupla nacionalidade também romana que anunciava o Evangelho de Jesus nas cidades de Icônio, Listra e Derbe chegando até a cidade de Antioquia da Pisídia.

Antes de continuar, permitam-me outras informações importantes sobre a minha estrutura familiar e ocupação profissional.

Em Colossos, a minha família desenvolvia a ocupação comum a muitos colossenses que era a tinturaria, ou seja, o tingimento da lã dos rebanhos de carneiros de nossa propriedade ou da lã adquirida dos nativos frígios, no mercado local.

Como havia muito trabalho a ser feito, tínhamos pessoas a nosso serviço, dentre eles vários escravos comprados no mercado de escravos, na maioria prisioneiros de guerra das incursões dos romanos sobre as muitas ilhas e povoados gregos, e que representavam para nós, mão-de-obra barata, legal eficiente e produtiva.

O ensino proclamado por São Paulo acerca de Jesus chegou até nós de forma contundente e muito vigorosa. As estruturas religiosas da nossa comunidade foram fortemente abaladas, principalmente porque sabíamos das perseguições que aquele jovem Paulo e seus discípulos haviam sofrido em Icônio e como, após fugirem para as cidades de Listra e Derbe, promoveram a cura de um homem paralítico desde o seu nascimento, a ponto de o povo reconhecê-lo e a Barnabé, seu companheiro de missão, como deuses que haviam descido à terra identificando-os com os deuses do Olimpo, respectivamente Hermes e Zeus.

Uma palavra dele chamou-nos a atenção. Segundo Epafras, que era de Colossos e que havia se convertido ao Cristianismo pelo ministério do apóstolo Paulo, este teria anunciado:

"Estamos trazendo boas novas para vocês, dizendo-lhes que se afastem dessas coisas vãs e se voltem para o Deus vivo que fez o céu, a terra, o mar e tudo o que neles há. No passado ele permitiu que todas as nações seguissem os seus próprios caminhos. Contudo, Deus não ficou sem testemunho: mostrou sua bondade, dando-lhes chuva do céu e colheitas no tempo certo, concedendo-lhes sustento com fartura e um coração cheio de alegria."

Assim foi o meu encontro com Jesus, ou seja, o contato do conhecimento sobre a bondade e a misericórdia de Deus, inteiramente gratuitos por causa do Seu amor pela humanidade. Desde então decidimos, minha esposa Áfia, meu filho Arquipo e eu, oferecer a nossa residência para o encontro de todos quantos desejassem conhecer e aprender mais sobre Deus e seu filho Jesus Cristo.

Epafras nos acompanhou nesta decisão e se tornou assim, o primeiro pastor da igreja de Colossos seguido por Arquipo, nosso filho, discipulado pelo próprio Epafras e, anos depois, reconhecido pastor da igreja durante o período em que Epafras esteve preso na companhia do apóstolo.

Os anos foram passando. A Igreja em nossa casa se desenvolvia de forma extraordinária. A nossa atividade profissional nos permitia lucratividade suficiente para somar uma pequena fortuna, porém, algo ainda não fora enfrentado com disposição e coragem em nosso trabalho.

Eu ainda era um "senhor de escravos", ou seja, tinha sob minhas ordens, pessoas que possuíam dignidade pessoal, mas ainda se encontravam prisioneiras de uma cultura escravagista na minha própria casa, portanto, na minha própria igreja e simplesmente tolerada por injunção da cultura e dos costumes sociais.

Entendo que, sob qualquer ponto de vista, não há coisa mais repugnante do que a escravatura. Alguma coisa eu precisaria fazer para eliminar da minha experiência com Jesus, esta situação tão degradante, injusta e perversa de manter pessoas dignas, impossibilitadas de usufruírem a própria liberdade.

Enquanto pensava sobre isso , fui assaltado pela dúvida que se apresentou à minha mente na forma das seguintes justificativas:

Que tipo de sanções eu poderia sofrer da sociedade de Colossos, caso eu decretasse a liberdade para todos os meus escravos?

De que forma os outros senhores de escravos, e não eram poucos, receberiam esta minha decisão?

Será que isto não causaria na sociedade escravocrata uma reação de represália contra os meus interesses comerciais?

Ou, talvez, será que isto não causaria revolta entre as centenas de escravos que passariam a lutar também pela própria liberdade?

Tão absorto eu estava pensando sobre a questão, que nem percebi a presença de alguém que viera me informar da fuga de um dos nossos escravos. O nome do fugitivo era Onésimo e ele trabalhava diretamente com a minha família, dentro da minha casa.

Tomando conhecimento disso, ordenei uma busca pela casa e galpões para verificar se, além da perda do patrimônio que ele representava para mim, também não havia sido lesado com o furto de algo mais de minha propriedade.

Eu estava furioso, mas, interiormente eu sabia que isto haveria de ter consequências para o desenvolvimento da minha fé em Jesus, pois, diante da situação, toda e qualquer decisão que eu viesse a tomar sobre Onésimo iria refletir na expansão do evangelho de amor de Deus pelos homens, fossem eles gregos ou romanos, judeus ou não-judeus, homens ou mulheres, escravos ou libertos.

Decidi dar tempo ao próprio tempo. Aliás, desde sempre eu aprendera que um dos grandes remédios para os grandes males da vida chama-se Tempo. E bem por isso, lembrei-me de um ensinamento proposto por Epafras quando, em um dos seus sermões ele citou parte de um Salmo que dizia:

"Entrega o teu caminho ao Senhor; confia n'Ele, e o mais, Ele fará."

E assim se passaram os dias, até que...!

Bem, meu amigo. A história irá prosseguir na próxima semana.

Convido você, nem que seja por mera curiosidade, para me acompanhar no meu reencontro com Onésimo, após um longo período de absoluto silêncio!

Até lá!

Deus te abençoe!

Pr. Oniel Prado

Verão de 2022

27/02/2022

Brasília, DF

Oniel Prado
Enviado por Oniel Prado em 28/02/2022
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