LEMBRANÇAS DE CARNAVAL
Lembro bem quando menino, acompanhar o carnaval da “provinciana” Florianópolis. Se bem que eu nunca fora um exímio folião, no entanto gostava de assistir os preparativos e os desfiles das escolas de samba, blocos de sujo, Orchestra Philarmônica Desterrense (criação de Tullo Cavallazzi, atração marcante de nossos carnavais) como também os desfiles das grandes sociedades, mais conhecidos por carros de mutação (únicos no Brasil, desde 1858). Para um garoto com pouco mais de 12 anos, ver os grandes carros alegóricos desfilando no entorno da praça XV com suas luzes coloridas se transformando em verdadeiras obras de arte e criatividade era sensacional. A sociedade de minha preferência era a Tenentes do Diabo, mas havia também Granadeiros da Ilha, Trevo de Ouro e Limoeiro. Não podemos esquecer de que na quinta-feira que antecedia o carnaval, acontecia o enterro da tristeza, preparação para quatro dias de inteira alegria e folia.
Nós os manezinhos, esperávamos a festa momesca para assistirmos o show de criatividade como também acompanhar o desfile de sua escola preferida cantando seu samba enredo. Antes e depois dos desfiles o entorno da praça XV ficava disponível para os foliões atravessarem madrugada adentro num misto de felicidade e realização pessoal, pois havia pessoas que economizavam o ano inteiro a fim de prepara a sua fantasia para sua redenção em apenas quatro dias, porém nunca esquecendo de que na Quarta-Feira de Cinzas era dia de fazer uma visita a catedral ou na paróquia de seu bairro se redimir dos “pecados” momescos.
Algumas famílias vivenciavam a quaresma com seus devidos respeitos. Nas sextas-feiras renunciavam a carne vermelha e a uma gelada. O cidadão que gostava de uma jogatina, evitava cair em pecado se afastando dos endereços tentadores. A gurizada evitava de cometerem “atos libidinosos”, os pais frequentavam a igreja com mais assiduidade e todos se imaginavam a um passo da porta do céu. As homilias durante as missas transitavam entre compreender e aceitar a cultura do povo até uma possível “excomungação” de um “pecador inveterado”, afinal o homem de batina se imaginava o único e verdadeiro representante de Cristo neste orbe com direito e dever de julgar um incauto cristão. As senhorias coitadinhas, se arrepiavam quando ouviam tais sermões, algumas se viam adentrando as portas das trevas ou seria o inferno de Dante?
Hoje faço uma reflexão do atual momento em que estamos vivenciando, onde um inimigo invisível (se é que podemos usar este termo) entrou em nossas vidas sem pelo menos pedir licença nos impondo restrições, ditando as normas, nos colocando em polvorosa. Seria um feedback para avaliarmos o nosso caminhar? Seria uma resposta para o “pecado da carne”? Realmente o que significa a palavra pecado? Creio que cada um encontrará a sua resposta. Voltando ao carnaval, não nos desesperemos, os anos seguintes teremos mais carnavais, mais folia e muita alegria para comemorarmos a vida, a paz. Porém os carnavais de outrora jamais serão vivenciados, ficarão simplesmente em nossas memórias. Não esqueçam, Quarta-Feira de Cinzas é dia de “rezar e pedir perdão” por tudo aquilo que deixamos de fazer acontecer em prol de nossa evolução neste orbe. Namastê.
Valmir Vilmar de Sousa (Vevê) 28/02/22