O BARBEIRO DO MEU BAIRRO
Hercílio, este era o seu nome. Um senhor baixinho, elétrico, dono da barbearia do meu bairro. Homem de olhar sério, não dava moleza a gurizada que frequentava seu salão, levados por seus pais é claro. Sentava a meninada em sua tradicional cadeira de barbeiro, se não me falha a memória dos anos 40 ou 50. Aquelas do tipo, madeira torneada, um tosco feltro ou algo semelhante na cor vermelha para ajeitar as nádegas de quem assentava-se aquele histórico móvel. Antes de preparar o paciente, quer dizer, cliente fazia a tradicional pergunta ao pai: qual a máquina que passo? O preocupado pai respondia – o de sempre. Através do espelho, o menino percebia o sorriso maroto do “bondoso” homem trazendo em suas mãos a velha e conhecida máquina manual. Para quem não é daqueles tempos e não sabe, não existiam estas facilidades de hoje, onde as máquinas são elétricas, na sua maioria made in China (se é que nós temos este conhecimento de que a maioria dos eletroeletrônicos são de origem asiática). Em tempos idos esta ferramenta era manual e seu manuseio era de doer em especial quando uma zero passeava por nosso cocuruto, era um festival de caretas e choros, quando este era permitido, pois o pai zelador de sua prole não se afastava do seu rebento enquanto estava sendo atendido magistralmente pelo seu Hercílio. Quando o “cliente” se fazia muito chorão, ele ofertava ao pequeno um pirulito para que pudesse continuar o seu trabalho sem machucar a moleira do “infeliz”. Alguns pais privados de paciência prometiam uma longa conversa quando chegassem em suas casas, tornando a volta para o lar um verdadeiro “suplício” para um inocente menino que apenas sentia medo da dor daquelas maquiavélicas máquinas, mais parecendo um trator a devastar suas cabeleiras.
A sua bondade era demasiadamente grande, pois quando um pai não podia levar sua prole ao barbeiro, o barbeiro vinha até suas casas para efetuar a “limpeza” no couro cabeludo das “lindas” e gentis crianças. Quando estas o avistavam de longe era um tal de se esconder, mas não tinha jeito, pois a mamãe já houvera recebido as orientações do papai: “hoje o seu Hercílio vem em casa para cortar o cabelo dos guris, não me faça passar vergonha. Deixe-os trancados em casa para não fugirem. Sabes que eles são muito espertos”.
Desta forma o seu Hercílio foi levando sua vida, criando sua prole, atendendo na barbearia, na casa dos clientes como também vez ou outra aos domingos ele atendia em sua casa aqueles que por qualquer razão não podiam frequentar sua humilde barbearia na Rua Valdemar Ouriques, no bairro Capoeiras onde eu nasci, cresci e muito frequentei aquele estabelecimento comercial que hoje me fez lembrar e sentir saudades de minha infância. Resolvi com muita humildade homenagear este cidadão que fez parte na história da meninada de Capoeiras, enquanto barbeiro exemplar que fora este homem.
Valmir Vilmar de Sousa (Vevê) 22/02/22