POETA BASTOS TIGRE
BASTOS TIGRE PREGANDO NO DESERTO
Nelson Marzullo Tangerini
Por amizade a Bastos Tigre, Nestor Tangerini, volta e meia republicava, em sua revista, sonetos do amigo, voz altiva do parnasianismo pernambucano. Como este, copiado da p. 8 da revista O Espeto, em dezembro de 1947:
“PRESENTE DE FESTAS
No dia de ano bom, peço-te apenas
Um beijo, um beijo estaladinho a medo,
Sob a copa vivente do arvoredo,
Entre amores perfeitos e açucena.
Bela morena, inveja das morenas,
Entre as morenas escolhida a dedo,
Olha que um beijo assim, dado em segredo
Vale por dez, por vinte, por centenas.
Vamos! Estala um beijo! Vamos que esta
Seja a caixinha de bombons, a ‘festa’
Que me dês, contentando os meus desejos.
E, se é certo o que afirma a voz do povo,
Hei de ganhar, durante este ano novo,
Trezentos e sessenta e cinco beijos”.
Mais adiante, outro soneto de Bastos Tigre ilustraria a p. 8 da mesma revista, em fevereiro de 1948:
“NO DESERTO
Eis que de Deus o povo se declara,
Em revolta; pragueja, em fúria, a plebe:
‘- Água, Moisés! O sol requeima a seara!’
Da nossa sede o céu não se apercebe!
Vendo Moisés a coisa feia, a vara
Vibra, raivoso, contra o monte Horeb;
E eis que corre, copiosa, a fonte clara!
Água a fartar; e toda gente bebe.
Bons tempos esses! Desmoralizou-se,
Hoje em dia, o prestígio milagreiro,
Que faz a vida deleitosa e doce!
Quando pela manhã busco o banheiro,
Penso tanto em Moisés... Oh! se ele fosse
Manda chuva... no Rio de Janeiro...
Manuel Bastos Tigre, que também assinava com o pseudônimo “Dom Xicote”, foi bibliotecário, jornalista, poeta, compositor, humorista e destacado publicitário brasileiro. Nasceu em Recife, Pernambuco, a 12 de maio de 1882. Faleceu no Rio de Janeiro, RJ, a 1 de agosto de de 1957.
Sua obra é vasta. Publicou inúmeros livros, como “Saguão da posteridade”, 1902, “Versos perversos”, 1905, “O maxixe”, 1906, “Moinhos de vento”, 1913, “O rapadura”, 1915, “Grão de bico”, 1915, “Bolhas de sabão”, 1919, “Arlequim”, 1922, entre tantos outros.