Pulei de tainha do trampolim do regatas. Quase me lasco!
O Clube de Regatas Barra do Ceará era para nós, moradores do bairro Antônio Bezerra, pelo menos essa era a ideia que eu tinha, o top dos clubes alcançáveis por nossa imaginação, em termo de diversão.
O Bicho era localizado na Barra do Ceará, e tinha uma imponência que impressionava. Ele ficava vendo o encontro do oceano Atlântico com o rio Ceará. Fui pesquisar e encontrei que Ivan Brito, arquiteto e professor da UFC, foi o projetista do clube, que teve sua construção pelos idos de 1959 e sua inauguração nos anos de 1960.
Até o final da década de 1970, se entrei num clube mais “chic” não lembro, mas, juro que isso não me fazia falta. Náutico, Iate e Ideal eram os bichões da época, que ficavam lá pros lados dos bairros “das Aldeotas e Meireles”. Na verdade, eu não tomava nem conhecimento de como eles eram ou funcionavam e, como se dizia num bom e claro cearencês, “Não fazia nem impeim de conhecer!”.
Desde menino que eu cortava o cabelo com um barbeiro de nome Benjamim. Sua barbearia, de uma só cadeira, ficava na Av. Mister Hull, hoje com 4 pistas, mas, que na época só tinha uma. Ficava bem próximo de onde eu morava. Papai era muito amigo dele.
Benjamin era muito conversador, guardando as devidas proporções, sabia de mais coisa sobre a vida dos frequentadores do seu estabelecimento e adjacências, que hoje, o Google e as demais redes sociais juntas.
Além da profissão, Benjamim tinha uma outra paixão declarada, que era o Clube de Regatas Barra do Ceará. Depois de um certo tempo, “já rapaizim”, também conversador, era difícil cortar o cabelo, em geral aos domingos, sem que não surgisse algum assunto que envolvesse o Regatas.
Se não me engano, ele era uma espécie de sócio/Diretor do clube e, quero acreditar que foi através dele, que passei a frequentar o tal, claro que esporadicamente e em datas especiais, porque a grana era bem curta.
Lembro que existiam três programações no Clube de Regatas, que viviam latentes nos meus desejos de jovem. Uma delas eram as “Matinês”, que se não me falha a memória, começava depois das 8h, iniciando com a liberação da piscina, para o delírio e o desfrute dos sócios, convidados e metidos.
O conjunto só começava a tocar depois das 12h, favorecendo um trânsito intenso da piscina para o bar e para o salão.
Outro ponto alto do Regatas eram suas festas, ou tertúlias como alguns gostam de falar. Menino, era bom demais!
Não fui frequentador assíduo, mas, foram momentos inesquecíveis, mesmo assim, acabei esquecendo!
Por fim, as festas de fim de ano, que eram contratadas pelas escolas, para comemorar as conclusões da 8ª série do primeiro grau (ensino fundamental) e do 3º ano do segundo grau (Ensino Médio).
Eu realmente era vidrado nessas festas de final de ano, inclusive já contei isso em outro texto.
O fato que reservei para destacar nesse texto, aconteceu em um desses dias de Matinês. Em geral eu chegava antes de abrir, e ficava por ali fazendo hora para entrar. Não queria perder nenhum segundo.
Certo dia, fiquei olhando e vi a galera “tibungando” dentro da piscina, quando olhei de onde partiam, eles estavam pulando dos seus altos trampolins. Fiquei parado por um momento, olhando e morrendo de inveja.
Dentro da cabeça, o diacho de um “cãozinho do mêi duzinferno” percebeu e começou a me atentar:
_ Vai também macho, tu né homi não?
Eu ainda besta, fui me chegando para perto das escadarias daqueles trampolins.
Um deles era muito alto para a minha coragem, no entanto o outro era alto que só uma porra!
Tomei coragem, daí disse para mim mesmo: “vou, mas, do trampolim mais baixo!”. Aquela voz escrota me invadiu e me atentou novamente:
_ Que do mais baixo bicho frouxo, se tu vai pular, pula logo do mais alto. Deixa de ser mole!!!
Tem um detalhe que eu preciso revelar, eu não sabia nadar, na verdade eu só sabia boiar, feito isopor.
Pois bem, comecei a subir as escadarias dos trampolins e, passando por mim um trânsito de pessoas com gente de todas as idades, gêneros e formas.
O que mais me intimidava e, ao mesmo tempo, me dava coragem, era o jeito natural de todos, que até corriam para chegar logo e, ao chegar, pulavam sorrindo numa impressionante tranquilidade.
Já eu coitado, ia me segurando pelo corrimão, bem devagarinho, esboçando um sorriso amarelo. Se não fosse o barulho das pessoas falando e gritando, e do conjunto tocando alto, seria possível ouvir o chacoalhar dos meus ossos, em especial, das minhas pernas, que tremiam mais do que vara verde.
Enfim, subi assim, com medo mesmo!
Ao chegar no topo, já não tinha mais jeito de descer, a contramão estava congestionada. No local, fui cair na besteira de olhar para baixo, ainda bem que fiz isso de relance, pois o mundo rodou na hora, chega "ingunhei"!
A coragem já estava me abandonando quando o diabo duma “cibita”, bem magrinha, me afastou para o lado e pulou como se aquilo fosse muito fácil e natural.
Ah! não contei pipoca, se ela pode eu posso. Me afastei um pouco e, antes que meu anjo protetor covarde dissesse não pula, eu pulei.
Até o capetinha que estava dentro de mim, se abrindo da minha “frouxidão”, se espantou com aquela iniciativa inusitada, ele jurava que eu não teria coragem, mas tive!
Dei uma “tainha” de fazer inveja ao Tarzan, foi aí a minha desgraça!!!
Eu via na televisão, a facilidade que era fazer aquilo, mas, só ali passei a entender que não era bem daquele jeito que a banda tocava.
Antes de chegar na água, não me perguntem como, os pés passaram por cima da cabeça, tentando chegar primeiro na superfície da água. Logo em seguida, foi possível ouvir uma pancada, feito uma pedra gigante despencando do alto e caindo dentro do mar.
Fui direto para o fundo com uma dor desgraçada invadindo meu corpo.
Usando o sangue gelado que possuo diante dos problemas, e o movimento cadenciado das mãos e braços, fui emergindo aos poucos.
Meu primeiro ato na superfície, depois de livrar os olhos da água da piscina, foi olhar no entorno, pois eu jurava que todos tinham visto e que a “mangação” ia ser geral.
Por incrível que pareça, para minha decepção, não foi nada disso o que aconteceu.
Na verdade, eu me senti mergulhado no meio do oceano, sem ninguém para que eu pudesse apelar por socorro.
Inventei um nado qualquer, até chegar na borda da piscina, onde passei um bom tempo, deixando a dor se afastar, até chegar a um nível suportável.
Primeiro sentei na borda, depois me levantei e saí lentamente, ainda com os reflexos da dor, pingando água com cloro pelo meio daquela multidão, me sentindo totalmente invisível!